segunda-feira, 8 de março de 2010

Oscar 2010 - final

  • Confesso que quando Preciosa foi anunciado como vencedor de Roteiro Adaptado, tive esperança de que mais vitórias viessem, sobretudo na categoria principal. Afinal, fora uma surpresa o triunfo sobre o grande favorito Amor sem escalas. Porém, meu entusiasmo foi arrefecendo na medida em que os prêmios se sucediam. Seria mesmo querer demais: um filme pequeno, estrelado por negros, com uma história difícil, ser consagrado como o melhor do ano. Repetindo o que escrevi aqui neste espaço outro dia: "A América de Obama ainda não chegou a tal nível de igualdade". Mas fiquei feliz, no final das contas. Ao menos, o Oscar ficou no nosso planeta, e não em um mundo virtual, cheio de magia e encantamento, mas vazio de significados.
  • Parabéns à Academia, pela maturidade de conferir o prêmio máximo do cinema a um filme sem grandes ousadias narrativas ou visuais, que se sustenta em seu roteiro e não em invencionices tecnológicas. Parabéns pela escolha de um filme que, mesmo não sendo excepcional, dá o que pensar depois que o assistimos. Parabéns por escolher um filme que mostra gente real, de carne e osso, como eu e você, vivendo problemas reais, em vez de contemplar aberrações extraterrestres. O megabadalado blockbuster de James Cameron até pode ser muito bem intencionado em sua mensagem ecológica, mas somente consigo entendê-lo como um produto voltado única e exclusivamente ao puro entretenimento mercantilista, cuja bilheteria mundial não reflete exatamente suas qualidades dramáticas.
  • Nem preciso dizer que detestei Avatar, desde o trailer, que vi ainda em novembro e já havia me tirado todo o interesse em assisti-lo (e que já não era grande mesmo). Mas tampouco acho Guerra ao terror um grande filme, como todos podem confirmar pelos comentários que fiz aqui no blog, em postagens passadas. Porém, entre uma farsa tão vazia que necessita de toda a promoção de sua tecnologia para servir de chamariz e um filme que coloca na tela o drama de pessoas comuns, fico com este último.
  • O grande problema é que Guerra ao terror corre o sério risco de se tornar um dos menos memoráveis ganhadores de Oscar. Daqui a cinco, dez anos, todos falarão de Avatar, mas não sei se alguém vai se lembrar da fita de Bigelow. Isso não é bom para o prêmio, que pode acumular mais um caso de escolha equivocada. Só o tempo dirá.
  • Tudo bem, Sandra Bullock é uma atriz querida em Hollywood, todo mundo gosta e a Academia já vinha querendo premiá-la há um bom tempo. Mas foi a primeira vez em que uma atriz ganhou, ao mesmo tempo, o Oscar de Melhor Atriz e o Framboesa de Ouro de Pior Atriz! Quem quiser conferir o desempenho de Sandra no filme que lhe rendeu o primeiro, deve esperar até o dia 26, quando Um sonho possível chega às telas brasileiras. Mas quem quiser vê-la justificando sua escolha no segundo, pode procurar nas locadoras Maluca paixão, uma dessas escolhas erradas que ela tanto fez ao longo da carreira.
  • E ainda não foi desta vez que vi Meryl Streep ganhar o Oscar... (sua última vitória foi em 1983, quando eu não assistia à premiação). Mas tudo bem: ano que vem, ela está lá de novo. Alguma dúvida?
  • Na semana passada fui ver O segredo dos seus olhos. Saí maravilhado com o novo trabalho de Juan José Campanella, de quem já conhecíamos O filho da noiva e Clube da lua. E pensei: vai ser um páreo duro com A fita branca, mas até o último momento acreditei que o ótimo filme de Michael Haneke fosse confirmar seu favoritismo. Mas quem viu ambos os trabalhos sabe que o prêmio ficou em ótimas mãos. O segredo dos seus olhos é um filme espetacular, com excelentes atuações, uma seqüência já antológica, rodada com câmera na mão, durante um jogo de futebol, e um dos finais mais dolorosos e chocantes dos últimos tempos. Merecido. E vibrei com o prêmio conquistado. É a segunda vez que a Argentina ganha o Oscar de Filme Estrangeiro. Enquanto isso, o Brasil sequer consegue emplacar um representante entre os finalistas. E vai continuar assim enquanto insistirem com produções de qualidade duvidosa, achando que só filme de violência urbana tem algum valor. Sugestão para a Ancine: ano que vem, pensem com carinho em Os famosos e os duendes da morte, de Esmir Filho. Não tem tiroteio, nem bandido, nem chacina em grandes cidades. Mas tem inteligência e criatividade. Serve?
  • Outra surpresa: a derrota da dupla Wallace e Gromit. E justamente para Logorama, em quem eu originariamente teria apostado, mas desisti, certo da força que os personagens da Aardman têm no Oscar. Mas foi justo, o filme é um primor. Esperemos por ele no Anima Mundi.
  • Muito legal a homenagem prestada aos filmes de terror. Mas alguém me explica por que a Academia pagou tributo a um gênero que ela mesma sempre desprezou? Mistério...
  • Sobre a festa. Gostei do visual do palco, despojado, mais limpo, sem aqueles penduricalhos que desviavam a atenção. Não gostei da "novidade" deste ano, de não apresentar as canções indicadas. Quem já não as tivesse escutado antes ficou sem as conhecer e sem um parâmetro de comparação. Também não sei quem teve a idéia esdrúxula de ressuscitar a antipática frase "And the winner is...", que já estava esquecida há décadas. Pior: alguns artistas anunciavam os prêmios da outra forma, "And the Oscar goes to...". Afinal, o que estava valendo? É preciso rever isso para o ano que vem.
  • Acertei 15 palpites que cravei aqui na semana passada, meu melhor desempenho em todos os tempos.
  • Para finalizar. Se a Rede Globo não tem interesse em transmitir o Oscar, devia deixar a tarefa a outra emissora aberta mais competente, como o SBT, que, todas as vezes em que exibiu a festa, sempre o fez com total brilhantismo. Minha sorte é que pude acompanhar tudo pela TNT, mas e quem não tem a mesma sorte? Pelo visto, podemos imaginar que todo cinéfilo é, antes de tudo, um BBBmaníaco e não se importa de perder grande parte da cerimônia para acompanhar os interessantíssimos debates protagonizados pelas novas sumidades da vida nacional. Oscar de Desrespeito é isso aí.

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