quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Time of bests and worsts

Para a derradeira coluna do ano, pensei em fazer uma homenagem a Stanley Kubrick, aproveitando os últimos dias da exposição que leva seu nome e fica em cartaz em São Paulo até 12 de janeiro - infelizmente não consegui vê-la, estive na cidade há um tempo, fui até o Museu da Imagem e do Som (MIS) onde está alocada, mas o tempo de espera na fila de entrada era de duas horas e sem qualquer garantia de que os visitantes conseguissem o acesso ao recinto. Resta-me torcer para que o Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) do Rio consiga trazê-la para a cidade, mas as chances são poucas. Resolvi então encerrar a temporada da mesma forma que no ano passado, trazendo a lista dos melhores e piores filmes do ano escolhidos pela revista Time. Serve como "aperitivo" para a minha lista pessoal, que publicarei na primeira semana de janeiro, quando o CineComFritas volta do recesso.

A lista de melhores surpreende por trazer uma produção européia na segunda posição, além de um documentário, pouco falado por aqui, mas que passou no Festival do Rio e está cotado para o Oscar da categoria. Aliás, é possível especular sobre os prováveis indicados a partir dos títulos citados pela publicação. O primeiro lugar ficou com Gravidade, de Alfonso Cuarón, soberano nesta e em outras listas de melhores (na minha não está). A seguir vem A grande beleza, de Paolo Sorrentino, sensação em Veneza, indicado pela Itália a concorrer ao Oscar de Filme Estrangeiro e que acabou de entrar em cartaz nesta sexta-feira.

Acima de todos, está Gravidade. O resto vem lá embaixo.
Os demais filmes da lista são:  Trapaça (de David. O Russell, também apontado como finalista ao Oscar, ainda inédito), Ela (nova loucura de Spike Jonze, que rendeu a Scarlett Johansson o prêmio de melhor atriz no Festival de Roma e também agraciada pelo National Board of Review - o detalhe é que ela não aparece em cena, só se ouve sua voz!), O grande mestre (de Wong Kar-Wai, elogiada biografia de Ip Man, o treinador de Bruce Lee), Velozes e furiosos 6 (grande surpresa, considerando o histórico da franquia, mas merecido, é provavelmente o melhor filme de ação do ano), Frozen - Uma aventura congelante (animação de Chris Buck, cotada para o Oscar, ainda inédita aqui), O ato de matar (de Joshua Oppenheimer, o tal documentário, dificilmente entra em cartaz mas está disponível na rede para quem quiser procurar), 12 anos de escravidão (recordista de indicações ao Globo de Ouro e fortíssimo candidato ao Oscar, dirigido pelo inglês Steve McQueen) e O hobbit - A desolação de Smaug (de Peter Jackson, que certamente abiscoitará também algumas indicações).

Entre os piores, nada de muito surpreendente. A relação traz títulos que foram verdadeiros fracassos de público e crítica, mais lá fora do que aqui, já que brasileiro em geral adora bobagem feita em Hollywood e enche os bolsos das distribuidoras, ajudando a fazer a fama de tais produtos. Como na lista dos melhores, esta também traz um documentário, logo na segunda posição. Na cabeça, está Gente grande 2 (de Dennis Dugan), seguido por Memórias de Salinger (não deixa de ser uma surpresa, ao que parece o escritor está se revirando na tumba pelo que fizeram com a história de sua vida, dirigida por Shane Salerno) e a seguir três dos blockbusters mais comentados do ano: A hospedeira (adaptação do romance homônimo de Stephanie Meyer, dirigido por Andrew Niccol), Depois da terra (outra canoa furada de M. Night Shyamalan e mais uma arranhada no currículo de Will Smith) e Oz - Mágico e poderoso (de Sam Raimi).

Apenas Deus perdoa: a segunda vez nem sempre é melhor.
Outros filmes que tiveram carreira meteórica nos cinemas daqui foram lembrados: O casamento do ano (comédia de Justin Zackam), O conselheiro do crime (de Ridley Scott) e RIPD - Agentes do além (de Robert Schwentke). Também houve espaço para Apenas Deus perdoa, nova parceria entre Nicolas Widing Refn e Ryan Gosling, muito esperada, mas com resultado bastante inferior ao trabalho anterior de ambos, o ótimo Drive (por aqui, só deve sair em DVD e não merece mesmo sorte melhor, é violento e descartável). Fechando a lista, Se beber não case III (de Todd Phillips), jogando a série em coma etílico e, em contrapartida positiva, ao que parece, sepultando as pretensões de uma quarta parte.

A verdade é que listar apenas dez filmes ruins é uma tarefa que a cada ano parece mais difícil, tamanha a quantidade de indigências que infestam as salas exibidoras do país, e o pior, sempre contando com um fortíssimo aparato de marketing, incentivando o público a assistir lixo (enquanto consome baldes de pipoca e refrigerantes, ou seja, lixo sobre lixo!). Neste sentido, é até benéfico que muito do cinema brasileiro produzido hoje não ganhe destaque no mercado internacional, ou a lista da Time seria praticamente dividida entre os blockbusters locais e os bloquibustes que também entulham a programação daqui. Ou será que coisas como O concurso e Casa da Mãe Joana 2 merecem algum crédito?

Voltamos em 3 de janeiro. Boas festas a todos!

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A batalha dos 32 reinos

Antes de ser cinéfilo, o editor deste blog é grande fã de futebol em geral e de Copa do Mundo em particular. Portanto, os leitores eventuais do espaço podem se preparar e, os que não gostam, se conformar porque, com a proximidade do evento, as colunas sobre a Sétima Arte vão cada vez mais dividir espaço com outros textos sobre o torneio - para quem não se liga no assunto, a Copa será disputada entre 12 de junho e 13 de julho de 2014 em 12 cidades brasileiras.

Para usar a expressão clichê por excelência, "a Copa já começou" na última sexta-feira (6/12), quando foram sorteados os oito grupos do torneio na Costa do Sauípe (BA). Depois de revelados os confrontos da primeira fase, enfim foi possível rascunhar alguma análise mais consistente do que o futuro pode reservar às 32 seleções que disputarão o título. Mas quem não gosta de futebol não precisa parar a leitura por aqui, porque não vou me dispor a analisar cada um dos grupos ou dos jogos. Deixo isso para os blogs especializados, para os jornalistas esportivos, fora que a palpitação pelo tema já esfriou, passada uma semana do sorteio. E certamente não há nada que eu escreva que já não tenha sido analisado, debatido ou se esgotado pelos analistas profissionais da imprensa esportiva nacional, mais gabaritada do que eu. Porém, como todo mundo é meio treinador de futebol no nosso país, tanto quanto somos críticos de cinema, não custa nada registrar algumas impressões e expectativas que tenho para a próxima Copa.

O Brasil ficou em um grupo relativamente fácil na primeira fase. Por mais que tenham mostrado alguma evolução nos últimos anos, ou em algum momento de suas histórias, Croácia, México e Camarões não podem ser vistos como adversários à altura da nossa seleção. É verdade que os mexicanos têm se revelado uma verdadeira pedrinha na nossa chuteira de uns anos para cá, já tendo nos derrotado em pelo menos duas decisões de peso - a Copa das Confederações de 1999 (4x3 para eles), lá mesmo no México, e o Torneio Olímpico do ano passado, em Londres (2x1 para eles) - , além de terem colecionado vitórias com certa freqüência em amistosos e em algumas edições da Copa América. Mas Copa do Mundo é outra história, e nesse sentido os mexicanos são fregueses históricos: em quatro confrontos anteriores no torneio, foram quatro vitórias brasileiras, todas a zero. Curiosamente, Brasil x México vão jogar em Fortaleza, mesmo local onde se encontraram em junho, pela Copa das Confederações. 

Mas o grupo do Brasil acabou sendo exceção. A Fifa precisa rever o critério para escalar cabeças de chave. O que fizeram Suíça e Bélgica até hoje que justifique o privilégio concedido a ambas? Não dá para basear a decisão em um ranking que muda a cada mês; parece que a história escrita por algumas seleções de nada vale ou foi apagada. Caso da Itália, quatro vezes campeã do mundo, que terminou no chamado grupo da morte, o D, junto com Uruguai e Inglaterra, ou seja, aconteceu o que todos temiam, uma chave com três campeões mundiais (e ainda com a Costa Rica para servir de fiel da balança), dos quais um nem passa para as oitavas de final. Enquanto isso, passam dois entre Colômbia, Grécia, Japão ou Costa do Marfim, que formam o grupo C. O mais correto é que, uma vez classificados, todos os campeões mundiais sejam garantidos como cabeças em seus grupos. Antigamente era assim. A Fifa se preocupa tanto com a seriedade da competição e oferece uma bola furada dessas para o público chutar. 

Quem também não tem do que reclamar é a Argentina, outra que foi agraciada pela sorte, cabeça do grupo F (de fácil), ao lado de Irã, Nigéria (já teve melhores dias) e a estreante Bósnia, com quem fará o jogo de estréia no Maracanã. Logo em seu primeiro jogo em Copas, a ex-república iugoslava terá a honra de jogar no mítico estádio. E o povo carioca poderá ver Messi bem de perto. Uma honra dupla, portanto. 

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Apertem Stop! As locadoras estão sumindo.

Reportagem publicada no Segundo Caderno do jornal O Globo há algumas semanas informa sobre a gradual extinção das videolocadoras de bairro, asfixiadas pela concorrência de novas tecnologias, como Netflix, TV a cabo e até (principalmente?) a troca de arquivos pela internet. Sem condições de se manterem, as lojas vão fechando em efeito cascata e hoje são poucas as que resistem. Para elas, o futuro é uma fita de VHS.

Acredito que todo cinéfilo, um dia, já foi rato de locadora. Por anos, um dos meus programas favoritos nos fins de semana foi alugar filmes, normalmente quatro por vez, para preencher cada hora livre do sábado e do domingo. Foi ali, em meio àquelas prateleiras multicoloridas pelas capinhas dos títulos em exposição, que forjei muito da minha cinefilia. Comecei a desenvolver gosto pelo cinema, ironicamente, por meio da leitura. No final dos anos 80, a Editora Abril começou a lançar guias de vídeo, aproveitando a nova onda de lazer que surgia no Brasil, então os videocassetes - aliás, chega a ser cruel perceber como a vida útil de certas tecnologias foi sendo abreviada com tanta rapidez. O videocassete chegou ao país em meados daquela década e sua popularização se deu justamente poucos anos depois, com o surgimento também dos primeiros videoclubes. Em pouco mais de 15 anos, já no final da década de 90, o VHS havia perdido espaço para os então futurosos DVDs, cuja existência durou ainda menos, logo substituídos pelo Blu-ray e sabe-se lá mais o que vem por aí.

Escolher filmes e amolar facas já são coisa do passado.
O primeiro guia saiu em 1988, um livro grosso de capa vermelha, que descobri meio por acaso na casa de uma prima em Minas Gerais, e o qual devorei em poucas horas, anotando cada título que me interessava pela sinopse, ou simplesmente tomando nota daqueles que vinham com a recomendação de "clássico", "obra-prima" ou "imperdível" justaposta ao verbete. Depois, de vota ao Rio, ia até uma pequena locadora que funcionava a poucas quadras de onde resido e caçava os títulos aos poucos, me atualizando e me "educando". Foi assim que vi Laranja mecânica pela primeira vez. Foi também nessa época que vi O homem elefante, O último tango em Paris, Betty Blue, O gabinete do Dr. Caligari, Tempos modernos, A felicidade não se compra e muitos outros considerados fundamentais na formação de um autêntico apreciador da Sétima Arte.

Com o tempo, fui diversificando as locações. A cada clássico que eu punha na cestinha, intercalava com algum filme mais moderno, podia ser até uma besteira, uma comedinha inconseqüente, um filmeco de horror barato, para equilibrar, afinal, não dava para ser "cabeça" demais. Fui assim misturando as referências, tarantinando sem me dar conta, abrindo meu arco de visões sobre cinema. São dessa época também filmes que o tempo sepultou na lembrança de quem viu, como Pin - Uma jornada além da loucura, Disfarce cruel, Hardware - O destruidor do futuro (que logo logo vai sair em DVD), e outros ainda menos cotados. O que sou hoje é o resultado desses meus anos de formação. Não deixo de assistir àquele clássico dos anos 40 que nunca tive a chance de ver, mas também me atualizo com boa vontade com alguns lançamentos, mesmo que dificilmente algum deles vá acrescentar alguma coisa a mim. Em certo sentido, aquela locadora (que não existe mais, foi das primeiras a fechar aqui no bairro) foi o meu Ateneu: por ela, conheci o mundo.

Um dia, este lugar já foi o paraíso.
Também é curioso observar como, apesar de o DVD estar em um processo de morte lenta e de o Blu-ray estar cada vez mais presente na vida dos consumidores de audiovisual (embora eu continue achando que é mais na marra, a indústria praticamente obriga o cidadão a trocar seu equipamento, lança edições especiais apenas no formato etc.), os filmes neste formato ainda atraem, acho que posso usar o termo, multidões quando são oferecidos a preços populares ou justos. Na última segunda-feira (2/12), a Vídeo Estação, locadora do Grupo Estação e uma das mais antigas da cidade, com quase 30 anos de existência, começou a liquidar seu imenso e valioso acervo. O horário de atendimento já estava encurtado, com a loja abrindo somente às 14h. No dia, por motivos pessoais, só pude chegar no local às 16h20 e fui surpreendido com uma extensa fila na porta da locadora. Era gente demais para entrar! E o espaço, por ser pequeno, só comportava uma quantidade limitada de pessoas por vez, coisa entre 10 ou 12. Esperei pacientemente na fila por uma hora e meia. Quando enfim consegui entrar, foi meio decepcionante, porque os principais títulos já haviam sido arrematados, claro, quem entrou primeiro se deu bem - havia um rapaz que devia ter cerca de 120 DVDs para levar! Mesmo assim, deu para trazer Incêndios, História real (do Lynch, praticamente esgotado), a primeira edição de Fanny e Alexander (que saiu em bancas, há anos fora de catálogo), e outros menos chamativos.

O fechamento do Vídeo Estação é emblemático dos novos tempos a que, forçosamente, temos de nos acostumar. Tempos em que ir à locadora da esquina já não representa nada, porque qualquer um daqueles milhares de títulos que nos cercam lá dentro podem ser facilmente encontrados a um clique de distância, a um custo bastante baixo. Como cinéfilo formado nesses pequenos cineclubes individuais, é com muita tristeza que vejo o ciclo se fechar. Como colecionador, porém, esfrego as mãos na expectativa pelo fechamento de outra grande locadora que resiste por aqui. Por quanto será que eles venderão o acervo?