quarta-feira, 19 de maio de 2010

Bitch slap

Os fãs de cinema extremo que assistem ou baixam filmes pela internet certamente já conhecem essa pérola da mediocridade cinematográfica. Run! Bitch run! (na tradução livre, “Corra, sua piranha, corra!”), de tão ruim, tem até um título alternativo, Bitch slap, como muitas vezes convém a um produto descartável que não se pretende mesmo levar a sério, mas nem um nem outro é capaz de redimi-lo de tamanha ruindade.

O rascunho de roteiro apresenta duas jovens estudantes de colégio religioso, a loura e recatada Catherine (Cheryl Lyone) e a morena e espevitada Rebecca (Christina Derosa), que resolvem sair por uma pequena cidade do interior dos EUA vendendo bíblias de porta em porta, mas são sistematicamente rechaçadas pelos moradores. Até que chegam a Moseley, onde quem dá as cartas é o alucinado Lobo, uma versão local do chefe miliciano. Corroído de drogas, ele acabou de assassinar uma das prostitutas que agencia. As duas, então, são seqüestradas por Lobo, estupradas e, depois, Rebecca ainda morre numa brincadeira de roleta russa promovida pela namorada do chefão, Marla (Ivet Corvea). Mas Catherine escapa, traumatizada, sendo internada no hospital de uma cidade próxima. Foge da internação e volta a Moseley em busca de vingança. Mas mesmo seu fim será trágico.

Tive o trabalho de resumir a história apenas por força do hábito. O encadeamento das ações é altamente previsível, desde o primeiro fotograma, e, ao contrário do que sugerem os minutos iniciais, nem há tanto erotismo. Aliás, parece que a proposta era se fazer uma versão ultra-alternativa do que Quentin Tarantino consagrou nos últimos anos, ou seja, aquela violência estilizada, escrachada, em tom pop, mas sempre com bom humor, o que não há aqui. Não pode nem mesmo ser considerado trash porque estes, em geral, costumam ser divertidos, ri-se da precariedade da produção, do nível de atuação do elenco, enfim, convida o espectador a entrar no espírito de farra. Aqui impera a boçalidade em todos os níveis, e se a idéia de diversão que o diretor Joseph Guzmán tem é essa, torna-se ainda mais complicado porque podemos estar diante de um caso patológico de sociopatia travestida de entretenimento.

É claro que ninguém deve procurar qualquer invocação psicanalítica no filme, que não se presta a qualquer leitura: é só a grossura pela grossura, sem conseqüência e sem limites. O tema da mocinha que desperta para a vida após ser vítima de um choque traumático só funciona como estopim de um festival de barbaridades, sem nenhum sentido moral. Confesso que nem o achei assim tão ofensivo, repulsivo, mesmo com várias cenas chocantes – o assassinato da prostituta, o estupro de Catherine, o esfaqueamento de um pervertido por ela ao retornar à cidade que, não satisfeita, ainda lhe arranca os olhos. Mas tudo isso é mostrado com um certo distanciamento, mal se vê direito o que acontece porque a câmera tem a percepção de evitar closes explícitos. E a maquiagem é péssima, muito mal-feita, evidenciando as falhas de realização, o que compromete mais ainda o resultado.

A escalada de sadismo segue num crescendo até o clímax, que não poderia ser outro – e não há prejuízo algum em revelá-lo aqui: Catherine esfaqueia Lobo várias vezes... no ânus. É um desfecho mais do que adequado a essa aberração. Aliás, todo o filme é feio, a cenografia, a fotografia suja, a música absurdamente neutra, que não marca nem sustenta cena alguma. As mulheres até se esforçam, mas não conseguem sequer fingir que são sensuais – Christina Derosa é a mais interessante, mas termina desperdiçada, morrendo logo. O elenco é totalmente desconhecido, e ninguém fez nada de importante além dessa bomba.

Por mais que eu goste de descobrir filmes alternativos, não dá para recomendar um produto tão ruim, burro, grosseiro, mal-feito, mal-acabado, que promove de maneira tão irresponsável o desvirtuamento moral da sociedade. Se é uma brincadeira, é de péssimo gosto. Um desses filmes que ficam melhor na obscuridade, sem o reconhecimento do público médio.


Nenhum comentário:

Postar um comentário