quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Mais chocante que a ficção

3.096 dias (2013)
Na semana passada, a polícia inglesa libertou três mulheres que viviam em cárcere privado há 30 anos em uma pequena cidade do interior daquele país. Embora chocante, o caso, infelizmente, está longe de ser isolado. De vez em quando a imprensa divulga episódios semelhantes, que apenas se distinguem pelo grau de perversidade e crueldade aplicado contra as vítimas. Há poucos meses, foi nos Estados Unidos, onde um lunático matinha também um trio de mulheres confinadas em um porão. Todos vêm se juntar ao mais comentado, ocorrido na Áustria em 2006, de forte impacto midiático: o de Natascha Kampusch.

Muitos devem se lembrar desse caso. Natascha foi seqüestrada no dia 2 de março de 98, a caminho da escola, quando tinha 10 anos. Permaneceu encarcerada por oito anos, até conseguir fugir, no dia 23 de agosto de 2006. Seu drama chocou e comoveu o mundo, também pelo fim trágico que teve seu seqüestrador, Wolfgang Priklopil, que se jogou na frente de um trem após descobrir a fuga da jovem. Parecia incrível que essa história de grande apelo popular ainda não tivesse sido contada pelo cinema, especialmente por Hollywood, que adora esse tipo de coisa. Na Áustria, foi feito um documentário para a TV em 2010. Mas somente agora, com bastante atraso, finalmente chegou às telas a versão ficcional, 3.096 dias, produção alemã dirigida por Sherry Hormann (de Flor do deserto), falada em inglês, certamente para facilitar a aceitação em solo americano.

Capa do livro, lançado em 2010.
O titulo é o mesmo do livro que foi lançado no Brasil em 2010 pela Verus, e que serviu de base para o roteiro. É narrado pela própria Natascha, que contou sua história a duas jornalistas, com riqueza de detalhes, alguns bastante chocantes, como as sessões de espancamento a que era submetida por Priklopil, às vezes por nada. Houve um primeiro livro lançado na Áustria logo depois de ela ter escapado, restrito ao mercado local, de tom aproveitador, tentando capitalizar em cima da "fama repentina" da moça e, segundo seu advogado, escrito com propósitos francamente comerciais.

Mas ninguém precisa ter lido o livro para ver o filme, mesmo porque não há que se preocupar se a adaptação foi "benfeita" ou "incompleta". Não é uma história de ficção, apesar de que, diante de casos assim, sempre ficamos pensando que tudo saiu da mente de algum roteirista perverso. Talvez seja até melhor não ler o relato antes, para que o choque seja maior, e neste caso, tal elemento é fundamental para a percepção do espectador, para uma experiência mais profunda. Felizmente o roteiro poupa o público de detalhes mais escabrosos, estes sim presentes no livro, além de sugerir um assédio sexual quase explícito entre Priklopil e Natascha. Há menos cenas de violência do que faz supor o texto escrito e este é um mérito, transmitir toda a crueldade da situação sem apelar para sensacionalismos baratos ou recursos fáceis de torturas óbvias, algo que os diretores do gênero horror já perderam a vergonha de fazer há anos. 

Cenas reais do cativeiro de Natascha.
Como Natascha, Antonia Campbell-Hugues tem desempenho visceral, também na parte corporal, com uma decadência física que salta aos olhos. Com quase 30 anos de idade, teve o desafio de interpretar uma adolescente, e convence plenamente no papel. Ela estreou fazendo ponta não creditada (!) como zumbi (!!!) em Todo mundo quase morto e a seguir esteve em Café da manhã em Plutão. Fez basicamente seriados e curtas, e seu grande papel antes deste fora em Brilho de uma paixão (2009), de Jane Campion. Também está no ainda inédito por aqui Under the skin, em que Scarlett Johansson interpreta uma extraterrestre. Já a versão infantil de Natascha aos 10 anos é defendida com assustadora naturalidade pela pequena estreante Amelia Pidgeon.

Já Priklopil ganha contornos bem nítidos na figura de Thure Lindhart, que esteve em Deixe a luz acesa, comentado aqui, e comprova ser um dos melhores intérpretes de sua geração, construindo com veracidade a figura de um homem atormentado que usa a vilania para disfarçar sua fragilidade - no filme, fica mais clara sua submissão à figura materna, que ganha uma dimensão maior da que aparenta no relato escrito.

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Nílton Santos foi considerado o maior lateral-esquerdo de todos os tempos no futebol mundial, escolha feita pela própria Fifa em 1998. Mais do que um gênio de sua posição, Nílton foi um dos grandes símbolos de uma era vitoriosa do Botafogo, único clube que defendeu ao longo de sua gloriosa carreira. Todas as homenagens possíveis, todas as palavras de enaltecimento já foram prestadas e proferidas nos momentos seguintes a seu passamento. Aqui, do meu canto, modestamente, me cabe apenas, sem nunca tê-lo visto atuar ao vivo - só pelos relatos dos mais antigos e nas imagens de arquivo das tevês - , agradecer por tudo que fez não só pelo nosso futebol, mas também, especialmente, pelo Botafogo. Que os seus Santos guiem a nossa Estrela Solitária aqui na terra, Nílton - e como estamos precisando!

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Igualdade sem vibração

O mordomo da Casa Branca (2012)
Dentro de mais alguns dias conheceremos os indicados ao Globo de Ouro, premiação que antecede e antecipa os finalistas do Oscar de 2014. Pelo burburinho e pelos boatos que chegam de fora, imagina-se a presença de alguns títulos muito comentados, alguns ainda inéditos por aqui (A vida secreta de Walter Mitty, Balada de um homem comum, Álbum de família, 12 anos de escravidão), outros que já estão em cartaz (Capitão Phillips, Blue Jasmine). Dentre estes já lançados, O mordomo da Casa Branca é praticamente garantido na lista final de indicados, que ainda não se sabe quantos serão, já que a Academia mudou as regras e agora permite um número variável de finalistas, entre 5 e 10, um absurdo sem tamanho, que vai acabar refletindo a qualidade das produções realizadas naquele ano (quanto menos concorrentes, mais fraca terá sido a safra). Será que não percebem isso?

Lee Daniels assumiu para si a voz da causa negra norte-americana desde que Preciosa (2009) comoveu platéias do mundo inteiro. Embora menos combativo que Spike Lee, que foi, durante os anos 90, o arauto da luta pela igualdade civil entre negros e brancos. Não centra suas narrativas na questão, embora sempre a discuta de forma sutil, introduzindo elementos que a coloquem em discussão. Curiosamente, seus dois trabalhos mais recentes entraram em cartaz ao mesmo tempo na cidade: o ousado mas exagerado Obsessão e este O mordomo da Casa Branca. Em todos, de uma forma ou outra, há a preocupação de discutir aspectos relacionados à causa civil norte-americana. Ao passo que o outro Lee, Spike, era mais agressivo, sobretudo pela trinca de filmes que o tornou mais conhecido, Faça a coisa certa (89, pelo qual foi indicado ao Oscar), Mais e melhores blues (90, o menos conhecido) e Febre da selva (91), que  traçavam um interessante painel sobre a questão dos negros na América de então, cada um ressaltando um aspecto dessa luta.

O diretor Lee Daniels no Festival do Rio.
No presente caso, o diretor partiu do artigo "A butler well served by this election", assinado por Will Haygood e publicado no Washington Post em 2008 (disponível na internet) para criar o personagem de Cecil Gaines, inspirado em uma figura real, Eugene Allen, que trabalhou na Casa Branca por 34 anos e serviu a oito presidentes, de Eisenhower a Reagan. No filme, que troca algumas referências pessoais para melhor desenvolvimento dramático, Gaines nasceu em uma fazenda de algodão no sul do país, viu o pai ser morto pelo patrão branco e, adolescente, saiu em busca de emprego. Consegue ser admitido na residência oficial sem muito esforço e passa as quase quatro décadas seguintes participando, mesmo que indiretamente, da vida e dos bastidores do governo norte-americano. Paralelamente, acompanhamos as várias lutas travadas pelos negros ianques pelo reconhecimento de seus direitos e de sua cidadania, com diversos momentos emblemáticos, como o movimento Black Power e os Panteras Negras, culminando com a eleição de Barack Obama em 2008.

Oprah e Whitaker estão cotados para o Oscar.
Forest Whitaker concede dignidade a seu personagem, e está bem como sempre, mas pouco pode fazer diante de um roteiro engessado (de Danny Strong, premiado pela série Mad men), que transforma Gaines em mero espectador passivo das transformações sociopolíticas vivenciadas pelos americanos em mais de 30 anos de luta pelos direitos civis. Mesmo tão perto do poder, ele não se engaja, não toma partido, não opina - simplesmente assiste a tudo, como se não pertencesse àquele universo, e somente vem a tomar alguma consciência já quase no fim, depois que um de seus filhos ingressa nos Panteras Negras. Oprah Winfrey faz a companheira de Gaines, em atuação sem destaque, mas que chama a atenção simplesmente por ser quem é. Porém, é dela a cena mais forte do filme, durante um jantar de família, em que esbofeteia o filho rebelde. Ao menos mostra um mínimo de posição, toma partido, mostra o que pensa, ao contrário de Gaines, quase um boneco a interligar fatos e circunstâncias históricas.

O elenco tem outros nomes interessantes e curiosos pulverizados em pequenos papéis, como Robin Williams, John Cusack, James Mardsen, dando vida respectivamente a Eisenhower, Lyndon Johnson e JFK; Mariah Carey, em ponta muda (é a mãe de Gaines, que tem duas cenas e morre louca), Lenny Kravitz, Terrence Howard, Cuba Gooding Jr. recuperando a dignidade da carreira. Mas a ponta mais comentada é a de Jane Fonda como Nancy Reagan, praticamente um clone da ex-primeira dama. É uma aparição de apenas cinco minutos, mas todos se impressionam com a semelhança entre ambas.

O verdadeiro Cecil Gaines, ou melhor, Eugene Allen.
O filme vai muito bem de bilheteria lá fora e, mesmo tratando de um assunto essencialmente norte-americano, vem fazendo bonito também nas bilheterias daqui. Na sessão a que estive presente, o público aplaudiu no final da projeção, mostrando que o povo brasileiro se identifica com a causa e apóia os movimentos de igualdade racial. Ou seja, se emociona com a essência da história, mesmo que a frieza da narrativa seja um obstáculo a uma melhor fruição. Agora, é aguardar para ver se o sucesso irá se confirmar no Oscar.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Oscarito 2013 - Os vencedores

Apesar de Gonzaga - De pai pra filho ter confirmado seu favoritismo no Grande Prêmio Cinema Brasil, seus 5 prêmios parecem poucos diante do número de indicações recebidas (concorria em mais 10 categorias) e em comparação com outros finalistas, que terminaram bem perto em quantidade. Na mesma noite em que o Botafogo deixou de figurar no G4 do Campeonato Brasileiro, ao menos sua torcida pôde festejar as 4 premiações que couberam a Heleno (e como seria bom ter um Heleno nesse time frouxo de hoje!), que, no entanto, perdeu o troféu mais certo da noite, o de ator para Rodrigo Santoro, que foi para Júlio Andrade. Já o ousado Febre do rato terminou com 3 prêmios, incluindo o de Melhor Filme pelo Voto Popular, ou seja, escolhido pelo público, uma conquista e tanto para um projeto tão anticomercial.

Algumas curiosidades: Dira Paes enfim levou seu Oscarito depois de três naufragadas indicações em anos anteriores. A Academia Brasileira de Cinema estendeu a homenagem a Cláudio Cavalcanti e concedeu-lhe um prêmio póstumo de Melhor Ator Coadjuvante, no momento mais emocionante da noite, empatado com João Miguel. Também houve empate, tríplice, em Direção de Arte. Prova de que, em termos cênicos, o cinema brasileiro está sobrando em qualidade.

Confira abaixo todos os vencedores do Oscarito 2013.

FILME: Gonzaga – De pai pra filho
DIRETOR: Breno Silveira (Gonzaga – De pai pra filho)
ATOR: Júlio Andrade (Gonzaga – De pai pra filho)
ATRIZ: Dira Paes (À beira do caminho)
ATOR COADJUVANTE: João Miguel (Gonzaga – De pai pra filho) e Cláudio Cavalcanti (Astro)
ATRIZ COADJUVANTE: Ângela Leal (Febre do rato) e Leandra Leal (Boca)
ROTEIRO ORIGINAL: Hílton Lacerda (Febre do rato)
ROTEIRO ADAPTADO: Davi França Mendes (Corações sujos)
DOCUMENTÁRIO: Raul – O início, o fim e o meio
FILME ESTRANGEIRO: Intocáveis (França)
FILME INFANTIL: Peixonauta – Agente secreto da O.S.T.R.A.
FILME DE ANIMAÇÃO: Brichos – A floresta é nossa
DIREÇÃO DE ARTE: Heleno,  Xingu e Corações sujos
FOTOGRAFIA: Heleno
FIGURINOS: Heleno
MAQUIAGEM: Heleno
SOM: Gonzaga – De pai pra filho
TRILHA SONORA: A música segundo Tom Jobim
TRILHA SONORA ORIGINAL: 2 coelhos
MONTAGEM: 2 coelhos
MONTAGEM DE DOCUMENTÁRIO: Raul – O início, o fim e o meio
EFEITOS ESPECIAIS: 2 coelhos
CURTA-METRAGEM: Laura
CURTA-METRAGEM DE ANIMAÇÃO: Cabeça de papelão
DOCUMENTÁRIO DE CURTA-METRAGEM: Elogio da graça

VOTO POPULAR - FILME: Febre do rato
VOTO POPULAR - DOCUMENTÁRIO: Raul – O início, o fim e o meio
VOTO POPULAR - FILME ESTRANGEIRO: Intocáveis (França)

PRÊMIO ESPECIAL DE PRESERVAÇÃO / MEMÓRIA: Ismail Xavier

HOMENAGEM: Ruth de Souza

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Ouro e maldição

Serra Pelada (2013)
Foi em 1924 que Erich Von Stroheim dirigiu este que é considerado um dos grandes clássicos de todos os tempos, Ouro e maldição. Ao longo de seus 240 minutos (na versão restaurada e mais completa), o filme mostra a degradação moral causada em três pessoas a partir de um prêmio milionário ganho na loteria. Inédita no Brasil por anos, essa obra-prima foi finalmente lançada em DVD há pouco tempo pela Colecione Clássicos, em dois volumes separados para fazer o consumidor gastar dinheiro duas vezes (quando o mais honesto seria uma edição dupla). Quase 90 anos depois, Heitor Dhalia fez uma espécie de homenagem, certamente involuntária, ao clássico de Stroheim com Serra Pelada, em cartaz nos cinemas do país.

Atenção: longe de mim a menor intenção de querer comparar aquele filme com este, ou tentar estabelecer paralelos na composição da trama ou na psicologia dos personagens. Mas foi impossível não me lembrar do magistral trabalho de Stroheim enquanto assistia ao drama com um pé na aventura imaginado por Dahlia e sua esposa Vera Egito, autores do roteiro. Guardadas as devidas distâncias entre um e outro, sobra a mesma degeneração de caráter dos envolvidos nas situações de ambos. No primeiro caso, por um fato consumado; no segundo, pelo delírio de uma fortuna incerta.

Eu era criança quando ouvia falar em Serra Pelada, no começo da década de 80. As gerações mais novas não fazem idéia do frenesi que se causou em parte da população a descoberta de que havia jazidas de ouro em uma região montanhosa do sul do Pará, o que atraiu milhares de homens ao local, todos ávidos pelo sonho da riqueza "fácil" - curiosamente, uma semana antes desta ficção, entrou em cartaz um documentário que trata exatamente do tema, Serra Pelada - A lenda da montanha de ouro. Não deve ter sido coincidência, mas sim estratégia de divulgação, para preparar a platéia. Vale assisti-lo como complemento de programa e para mais informações a respeito. É a partir dali, com a situação devidamente contextualizada, que o espectador pode aproveitar mais a narrativa criada por Dhalia. Fato é que Serra Pelada povoou a imaginação dos brasileiros de então, e foi até parodiada pelos Trapalhões (Os Trapalhões em Serra Pelada, 1984, feito já no fim do ciclo do ouro e considerado por fãs como o melhor trabalho do quarteto).

Juliano e Joaquim: amigos, amigos, ouro à parte.
Em 1980, os amigos Juliano e Joaquim chegam de São Paulo ao eldorado paraense dispostos a fazer fortuna. Joaquim tem um objetivo mais claro: enriquecer o suficiente para conseguir dar uma vida melhor à esposa grávida, já que seu salário de professor não supre todas as lacunas - ou seja, em mais de 30 anos, o Brasil até pode ter crescido em muitos aspectos, mas certas situações nunca mudaram! Ambos descobrem que há uma hierarquia no garimpo, cujo posto mais elevado é o de capitalista, o "dono" dos barrancos de onde é extraído o ouro. Descobrem também que naquele universo onde se respira ambição, ninguém é confiável e as barreiras morais podem ser facilmente transpostas, dependendo das necessidades ou dos interesses. Com o tempo, a degradação moral vai se abatendo sobre os dois homens. Joaquim se vê forçado a deixar seus valores de lado, enquanto Juliano se contamina pela febre do ouro. No que talvez seja uma falha do roteiro, sua origem é desconhecida, assim, não é possível avaliar até que ponto ele se transforma em nome da ambição e da ganância. No começo sempre parceiro de Joaquim, aos poucos Juliano vira o mais selvagem dos capitalistas locais, primeiro disputando cada barranco com os chefes do garimpo, depois se perdendo nos braços da prostituta Teresa.

Sophie Charlotte é a pepita mais cobiçada e valiosa do garimpo.
O filme começa com uma bela imagem: cenas reais do garimpo se sobrepõem na tela enquanto dentro das letras do título que surge aos poucos são projetadas chamadas de abertura do Jornal Nacional da época, tratando do assunto. Outras imagens reais são inseridas ao filme, alternando-se com as tomadas ficcionais. Esse recurso confere maior veracidade à produção, que precisou reproduzir em locações uma estrutura física que já não existe (hoje é um lago). Aliás, toda a parte técnica e visual é exemplar, como a fotografia de tons amarelados, reforçando o aspecto sujo do garimpo. Dhalia volta a impor sua marca cenográfica que se tornou conhecida em Nina e O cheiro do ralo, mas que estava suspensa desde À deriva. Serra Pelada era, então, o grande eldorado nacional, sonho e esperança de milhares de brasileiros, que enxergava ali uma alternativa para mudar de vida. O filme cobre o período em que o garimpo esteve ativo e termina com a marcha pelas Diretas Já, em 1984. O Brasil mudava, e outros sonhos, agora de democracia, vinham povoar a mente da população. 

Escalado inicialmente para viver Juliano, Wagner Moura precisou declinar do convite, por conta de outros
Vista geral de Serra Pelada nos anos 80.
compromissos, mas Dhalia conseguiu encaixá-lo em um papel menor, de um dos capitalistas, em que mesmo assim dá seu show particular, quase irreconhecível por causa de uma calva (ótimo efeito de maquiagem). Seu papel acabou indo para o xará do personagem, Juliano Cazarré, cujas feições brutas acabam sendo mais adequadas ao tipo. Júlio Andrade (que pode ganhar o Oscarito na semana que vem pelo seu Gonzaguinha de
Gonzaga - De pai pra filho) tem outra boa composição como Joaquim, indo da inocência singela do professor disposto a conquistar um sonho à brutalização do garimpeiro na luta pela sobrevivência em um ambiente hostil, enquanto Sophie Charlotte ilumina a tela como Teresa. Além da fotografia e da direção de arte, a trilha sonora divertida é outro atrativo. Há uma cena de humor involuntário, quando Teresa tenta fugir do garimpo e é perseguida pelos capangas de Juliano (com direito a tropeção e tudo). O final é um tanto esticado e abrupto, mas não compromete.

Uma pena que Serra Pelada não esteja indo bem de bilheteria. O filme atraiu, até o momento, menos de 300 mil espectadores às salas de exibição, rendendo bem menos do que se esperava. Sinal preocupante de que o povo brasileiro não está muito interessado em histórias mais elaboradas ou complexas, sobretudo aquelas de tema difícil, preferindo comédias muitas vezes de baixa qualidade.