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Serra Pelada (2013) |
Foi
em 1924 que Erich Von Stroheim dirigiu este que é considerado um dos grandes
clássicos de todos os tempos, Ouro e
maldição. Ao longo de seus 240 minutos (na versão restaurada e mais completa), o filme mostra a degradação moral
causada em três pessoas a partir de um prêmio milionário ganho na loteria.
Inédita no Brasil por anos, essa obra-prima foi finalmente lançada em DVD há
pouco tempo pela Colecione Clássicos, em dois volumes separados para fazer o
consumidor gastar dinheiro duas vezes (quando o mais honesto seria uma edição
dupla). Quase 90 anos depois, Heitor Dhalia fez uma espécie de homenagem,
certamente involuntária, ao clássico de Stroheim com Serra Pelada, em cartaz nos cinemas do país.
Atenção:
longe de mim a menor intenção de querer comparar aquele filme com este, ou
tentar estabelecer paralelos na composição da trama ou na psicologia dos
personagens. Mas foi impossível não me lembrar do magistral trabalho de
Stroheim enquanto assistia ao drama com um pé na aventura imaginado por Dahlia
e sua esposa Vera Egito, autores do roteiro. Guardadas as devidas distâncias
entre um e outro, sobra a mesma degeneração de caráter dos envolvidos nas
situações de ambos. No primeiro caso, por um fato consumado; no segundo, pelo delírio de uma fortuna incerta.
Eu
era criança quando ouvia falar em Serra Pelada, no começo da década de 80. As
gerações mais novas não fazem idéia do frenesi que se causou em parte da
população a descoberta de que havia jazidas de ouro em uma região montanhosa do
sul do Pará, o que atraiu milhares de homens ao local, todos ávidos pelo sonho
da riqueza "fácil" - curiosamente, uma semana antes desta ficção,
entrou em cartaz um documentário que trata exatamente do tema, Serra Pelada - A lenda da montanha de ouro.
Não deve ter sido coincidência, mas sim estratégia de divulgação, para preparar
a platéia. Vale assisti-lo como complemento de programa e para mais informações
a respeito. É a partir dali, com a situação devidamente contextualizada, que o
espectador pode aproveitar mais a narrativa criada por Dhalia. Fato é que Serra
Pelada povoou a imaginação dos brasileiros de então, e foi até parodiada pelos
Trapalhões (Os Trapalhões em Serra Pelada,
1984, feito já no fim do ciclo do ouro e considerado por fãs como o melhor
trabalho do quarteto).
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Juliano e Joaquim: amigos, amigos, ouro à parte. |
Em
1980, os amigos Juliano e Joaquim chegam de São Paulo ao eldorado paraense
dispostos a fazer fortuna. Joaquim tem um objetivo mais claro: enriquecer o
suficiente para conseguir dar uma vida melhor à esposa grávida, já que seu
salário de professor não supre todas as lacunas - ou seja, em mais de 30 anos,
o Brasil até pode ter crescido em muitos aspectos, mas certas situações nunca
mudaram! Ambos descobrem que há uma hierarquia no garimpo, cujo posto mais
elevado é o de capitalista, o "dono" dos barrancos de onde é extraído
o ouro. Descobrem também que naquele universo onde se respira ambição, ninguém
é confiável e as barreiras morais podem ser facilmente transpostas, dependendo
das necessidades ou dos interesses. Com o tempo, a degradação moral vai se
abatendo sobre os dois homens. Joaquim se vê forçado a deixar seus valores de
lado, enquanto Juliano se contamina pela febre do ouro. No que talvez seja uma
falha do roteiro, sua origem é desconhecida, assim, não é possível avaliar até
que ponto ele se transforma em nome da ambição e da ganância. No começo sempre
parceiro de Joaquim, aos poucos Juliano vira o mais selvagem dos capitalistas
locais, primeiro disputando cada barranco com os chefes do garimpo, depois se
perdendo nos braços da prostituta Teresa.
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Sophie Charlotte é a pepita mais cobiçada e valiosa do garimpo. |
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Vista geral de Serra Pelada nos anos 80. |
Uma
pena que Serra Pelada não esteja indo
bem de bilheteria. O filme atraiu, até o momento, menos de 300 mil espectadores
às salas de exibição, rendendo bem menos do que se esperava. Sinal preocupante
de que o povo brasileiro não está muito interessado em histórias mais
elaboradas ou complexas, sobretudo aquelas de tema difícil, preferindo comédias muitas
vezes de baixa qualidade.
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