quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Quando a leitura vira pesadelo

O senhor Babadook (2013)
Hoje em dia é tão difícil assistir a um filme de terror minimamente decente, ou seja, que fuja à fórmula fácil de sangue a rodo e tortura gratuita, que quando descobrimos algum que trilhe outros caminhos já é motivo de aplauso. Este O senhor Babadook é uma produção australiana, país que tem relativa tradição no gênero, e dá para imaginar o estrago que Hollywood vai fazer no caso de uma muito provável refilmagem local.

Uma jovem mãe viúva se muda com seu filho de 8 anos para uma nova casa em Sydney, na tentativa de dar fim aos pesadelos que assolam as noites do menino. Só que o tiro sai pela culatra: o moleque não só continua tendo sonhos aterradores, mas também vai se tornando cada vez mais violento. As ameaças e atitudes agressivas do pequeno coincidem com a descoberta de um livro infantil, chamado Babadook, de história e desenhos (como pop-ups, que saltam das páginas quando são abertas ou viradas) altamente perturbadores, tratando de morte e assassinato  muito instrutivo para o universo infantil, como se vê. A mulher destrói o livro, mas agora ela é quem passa a ser assombrada por pesadelos. E, brevemente, descobrirá que aquela não é apenas uma historinha supostamente para crianças: é uma força demoníaca que quer destruir ela e o filho.

O que me incomodou no filme foram os cortes, rápidos e por vezes abruptos, interrompendo cenas que soam incompletas com tal recurso. A montagem, por tabela, é acelerada, o que compromete um pouco o clima assustador que a história, de maneira gradual, vai criando. Mas, quando se propõe a montar uma atmosfera de medo e tensão, o roteiro consegue, com sobras. Há cenas realmente de gelar o sangue, a ponto de eu pensar que não é um filme adequado para se ver sozinho à noite, e isso é um elogio e tanto a qualquer produção atual do gênero.

A figura do misterioso Babadook nunca é vista de forma explícita, apenas sua silhueta ou reproduzida nos desenhos  também aparece encarnada em tipos vistos nas primeiras experiências cinematográficas de Meliès (mas tudo pode ser um delírio visual da mãe).

Também me frustrou a ausência de uma explicação para as origens do personagem. O Babadook seria um livro amaldiçoado? Um demônio ancestral? A representação de uma maldição milenar que habita aquela casa? O roteiro não explica nem fornece pistas para o espectador. Mas esse detalhe não compromete a montanha-russa de sustos bem-encaixados. 

A diretora e roteirista Jennifer Kent, que também é atriz (esteve em Babe, o porquinho atrapalhado na cidade, 1998, mas não aparece aqui) apresenta um bom cartão de visitas na sua estréia no longa-metragem. Ajustes precisam ser feitos, mas o início é promissor.

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