sexta-feira, 30 de março de 2012

Estréias da semana

HELENO - Não é uma biografia tradicional. O roteiro enfatiza momentos e passagens mais marcantes do genial Heleno de Freitas, ídolo do Botafogo e da Seleção Brasileira nos anos 40. Muito aguardado, chega referendado por uma atuação visceral de Rodrigo Santoro que chegou a se transfigurar fisicamente para viver o craque em seus dias de ocaso e uma adequada fotografia em preto e branco (alvinegra, como convém) do mestre Walter Carvalho. Prova que o Botafogo tem histórico de abrigar jogadores problemáticos. Na esteira de Heleno, vieram Garrincha, Josimar, Hernandes (quem???) e, recente e atualmente, Jóbson, o "crack" da vez. Curiosidade conexa: Heleno é o quarto artilheiro da história do Botafogo, com 204 gols em 235 jogos; pela Seleção, foram 15 gols em 18 partidas. Quem fez a pesquisa inicial do filme foi o Carlos Otávio, um ex-colega de faculdade, o que mostra que alguns daquela turma deram certo na vida.

A NOVELA DAS 8 - Em 1978, como não havia BBB (é, já fomos inteligentes), o povão se alienava com Dancin' days, um grande sucesso no horário das 20h. Enquanto isso, a ditadura torturava e assassinava estudantes e trabalhadores. É nesse período de efervescência política que se desenrola essa história, muito prejudicada por um roteiro frouxo, cheia de personagens mal construídos e situações inconsistentes. Pode ser divertido, desde que não seja levado a sério.

O LORAX - EM BUSCA DA TRÚFULA PERDIDA - Animação ecologicamente correta. Menino tenta evitar o desmatamento de uma floresta contando com a ajuda do Lorax, um ser alaranjado que não é bicho, não é gente, não é nada - só uma figura esquisita que logo vai virar boneco e ajudar a vender lanche no McDonald's. O desenho tem pedigree: é dos mesmos criadores do bacana Meu malvado favorito. Para quem for ao shopping passear com o sobrinho.

UM MÉTODO PERIGOSO - Mais uma prova que David Cronemberg enterrou seu passado de filmes esquisitos e se dedicou a fazer cinema sério. A trama acompanha a complexa relação entre os pais da psicanálise Sigmund Freud e Carl Jung e uma das primeiras mulheres psicanalistas da história, Sabina Spielrain. Vale uma conferida.

A DANÇARINA E O LADRÃO - O diretor Fernando Trueba, dos hoje esquecidos Sedução e O rei pasmado e a rainha nua, retorna com esse filme muito elogiado por onde passou, sobre dois homens que seguem caminhos diferentes ao retornarem ao Chile, seu país natal, após a queda do ditador Pinochet. Um busca vingança; o outro, uma família. Representante espanhol na disputa pelo Oscar de Filme Estrangeiro em 2010, não ficou entre os finalistas. Boa alternativa.

FÚRIA DE TITÃS 2 - Quem viu o primeiro sabe exatamente o que vai encontrar nessa seqüência óbvia. Quem não viu vai continuar sem se interessar. Para os que ainda não se cansaram, a exibição é em 3D em algumas salas. A frase de divulgação usada no teaser é um primor de nonsense: "Este ano, você irá para o inferno"!

Mais um cinema de rua reabre as portas

Depois de um ano e meio fechado para obras, o pequeno Cine Candido Mendes retoma suas atividades nesta sexta-feira. A sala funciona na galeria anexa do prédio da Universidade Candido Mendes, em Ipanema, onde também está situado o teatro de mesmo nome. Eu cheguei a ir várias vezes nele antes do fechamento. Uma curiosidade do espaço é que, às terças-feiras, é cobrada meia entrada para todos os espectadores (desde que não seja feriado). Não sei se essa promoção irá vigorar novamente agora. Bem que deveria, porque os preços são salgados: R$16 de terça a quinta e R$18 nos finais de semana - outra tendência dessas salas menores é que elas não abrem às segundas-feiras.
O mês de abril está se tornando o da ressurreição dos cinemas de rua no Rio. Ano passado, por essa mesma época, foi o Cine Jóia que reativou suas atividades. Aguardemos para ver quem voltará do mundo dos mortos em 2013.
Boas-vindas de volta ao Candido Mendes!

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Ontem pela manhã postei um texto intitulado "E Lobato se revira no túmulo". Abordava uma pesquisa feita recentemente sobre os hábitos de leitura do brasileiro. Quando visualizei a postagem, estava tudo normal. À noite, porém, quando abri o blog, vi que tinha acontecido alguma coisa e o texto estava cheio de caracteres, tornando impossível a leitura. Assim, tive de deletá-lo. Não sei se alguém chegou (ou conseguiu) lê-lo. Não sei o que aconteceu. Peço desculpas oas eventuais leitores deste espaço. Embora já tenha esfriado, o tema é muito interessante e merece ser debatido aqui. Voltarei a ele em breve.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Treze à mesa e um traidor entre nós

Um dos lances mais comentados dos últimos dias foi o pênalti perdido pelo jogador Léo Rocha, do Treze, no jogo contra o Botafogo pela Copa do Brasil. Mais do que o lance em si, o que chama a atenção é a rigidez da punição aplicada ao atleta pela diretoria de seu clube.

Para situar o leitor. Na Copa do Brasil, nas duas etapas iniciais, passa à fase seguinte o time visitante que vencer por dois ou mais gols de diferença; ou que marcar mais pontos; ou que assinalar mais gols que o oponente na soma das duas partidas, se houver. Botafogo e Treze empataram por 1x1 no Engenhão, mesmo placar do primeiro jogo, disputado na semana anterior em João Pessoa. Assim, a decisão da vaga teve de ser decidida nos pênaltis. O Botafogo vencia por 3x2 quando coube a Léo Rocha cobrar a última penalidade, que poderia empatar a contenda, o que prorrogaria a disputa pela vaga (e, obviamente, a agonia da torcida do Botafogo, que dominou o jogo todo e não teve competência para liquidar a fatura nos 90 minutos, eta time que não sabe ganhar!). Eis que o jogador, em vez de fazer uma cobrança normal, inventou de dar a famosa “cavadinha” celebrizada pelo Loco Abreu – que, por ironia, já havia perdido sua cobrança, mesmo batendo normalmente. Ao que parece, se arrependeu no meio do caminho, chutou fraco e o goleiro Jefferson espalmou, garantindo a classificação do Botafogo.

Veja o lance aqui: http://www.youtube.com/watch?v=De4XhizYeCQ

A reação intempestiva do arqueiro, que correu até o jogador adversário e despejou algumas poucas e boas em seu ouvido, certamente chamou menos a atenção do que a atitude radical dos diretores do Treze que, horas depois da partida, decretaram o afastamento do jogador, primeiro, disseram, por uma medida de segurança, já que a torcida paraibana poderia recebê-lo sob ameaças, e posteriormente assumindo sua insatisfação com a brincadeirinha irresponsável do jogador, que causou a eliminação do Treze da competição nacional.

Será que havia motivo real para demitir o jogador por causa desse lance? O que pode ter representado a eliminação do time de Campina Grande da Copa do Brasil em termos práticos? Claro que é menos dinheiro em caixa, já que os participantes vão sendo remunerados proporcionalmente à fase que atravessam, mas isso pode ser atenuado. O Treze é grande em seus limites estaduais, mas um zero à esquerda quando projetado no cenário global do futebol brasileiro; dificilmente iria muito longe, mesmo porque o time é fraco (tenho forte convicção de que também o Botafogo não terá melhor sorte, mas não irei me ocupar disso aqui). Estavam se enfrentando um time grande e outro nanico: a regra da lógica indica a classificação do time grande, sem que haja qualquer absurdo nisso – o contrário é que causaria espécie, e, aí sim, justificaria uma demissão em massa do elenco do Botafogo. Era um jogo de volta da fase classificatória da Copa do Brasil: não era a final, nem a semifinal, menos ainda uma quarta de final, jogos de carga dramática bem maior, eivados de uma importância maiúscula que os encontros preliminares estão longe de se revestir. Ou seja, o Treze foi eliminado em um jogo no qual, em condições normais, sequer teria chegado àquela decisão. Sem maiores prejuízos. O que pensavam os dirigentes que demitiram Léo Rocha? Que o Treze chegaria à final, passando por cima de todos, como um Barcelona do Sertão? Que o Treze tem time para disputar qualquer competição de igual para igual com equipes mais fortes? Ou será que acreditavam que havia um planejamento feito com seriedade, visando a levar o time campineiro a disputar a Libertadores em 2013? Como o incompetente Léo Rocha teve a ousadia de frustrar todos esses projetos, acabou punido com a demissão.

Talvez um misto de arrogância, falta de noção e absoluto amadorismo possa justificar a decisão dos dirigentes do time campineiro. Um deles chegou a declarar que “no Treze só jogam vencedores.” Se é assim, então, os vencedores devem estar mesmo apenas dentro das quatro linhas – porque fora, só o que se viu foram cartolas inaptos e sem a mínima idéia do que significa administrar um clube.

terça-feira, 27 de março de 2012

Muppets para adultos

Anos antes de ser mundialmente consagrado pela trilogia O senhor dos anéis, Peter Jackson realizou uma das mais infames e ultrajantes animações que se pode assistir: Meet the Feebles, que nunca foi lançado comercialmente por aqui, nem depois que o diretor se tornou famoso (mas pode ser encontrado facilmente na net, sem apologismo de qualquer espécie). E é também uma das mais engraçadas incursões de um diretor pelo gênero.

Os Feebles formam uma banda que se apresenta em um programa de sucesso da TV australiana, mas a atração fica ameaçada quando a emissora que o transmite recebe a proposta para substituí-lo por uma série. O filme acompanha os preparativos do que pode ser o show salvador dos Feebles, exibido ao vivo para todo o país. Tudo correria numa boa, não fosse a banda formada pelos personagens mais insanos reunidos.

O roteiro episódico acompanha um pouco de cada um dos personagens, tanto os que formam os Feebles quanto os que gravitam em torno de seu universo. A estrela da companhia é Heidi, a vocalista, uma hipopótamo temperamental, com afetações de estrela, casada com o empresário do grupo - o flashback mostrando como eles se conheceram é hilário. Ela é a mais normal da equipe, mantendo uma aura de pureza que será devidamente desvirtuada no final, numa sucessão de cenas alucinantes. Nos bastidores dos Feebles, rola muito sexo e perversões de toda ordem. Um dos personagens se descobre portador do vírus da aids e sua tragédia é explorada pela imprensa sensacionalista, representada por uma repórter mosca que o persegue sem piedade. O diretor do show, com pretensões artísticas, tem fixação por sodomia, e externa sua "preferência" em um número musical de improviso. Um jovem que se junta à equipe se apaixona por uma das atrizes de apoio, mas se desilude ao descobrir que ela é explorada sexualmente. E assim sucessivamente.

No fundo o que Peter Jackson fez foi narrar uma fábula delirante sobre os bastidores da televisão, soltando farpas para todos os lados, se esbaldando com o que, no fundo, era uma brincadeira de cinéfilo. Ali vemos uma liberdade narrativa e criadora que o diretor nunca mais iria experimentar, e que já havia ficado explícita em seu filme de estréia, o anterior Trash - náusea total. Já demonstrava suas qualidades no domínio de câmera, na engeaceitas com certa benevolência, teria vida fácil.

Melhor ficarmos mesmo com o original, objeto de culto e uma diversão de primeira linha, desde que o espectador embarque na história.

segunda-feira, 26 de março de 2012

E-book: o livro do futuro

Os catastrofistas de plantão que gostam de anunciar o fim do livro devem rever seus conceitos. Ele não desaparecerá: no máximo, passará por uma transformação. Embora de maneira ainda tímida, os e-books já são uma realidade e, se ainda não se popularizaram completamente, isso se deve a uma certa insegurança do mercado editorial que, contudo, prepara-se para investir pesado nesse novo equipamento.

As perspectivas animadoras são defendidas pelo professor e cientista social Alexandre Linares em extenso artigo publicado no site em fevereiro de 2011. Para ele, o e-book só não tem uma visibilidade maior, ainda, porque o mercado teme se aventurar por um nicho ainda incerto. “É uma tendência do mercado em geral: esperar alguém ir na frente, bater a cabeça, errar, se machucar... para depois o restante seguir a trilha já traçada sem dificuldades.”

Mesmo com tantas reticências, já se observam iniciativas de fomento ao incentivo do livro digital, como a da Ediouro, com seu projeto Singular Digital, que distribui conteúdo eletrônico de diversas publicações sob demanda e da forma que o cliente preferir; ou a do Grupo Positivo, que aposta em um e-reader próprio para marcar espaço entre as plataformas tecnológicas que aos poucos começam a conquistar o leitor brasileiro.

“Livro é conteúdo, não forma”, continua Linares. Para ele, outro motivo pelo qual há tanto receio em apostar em uma nova forma de leitura é que as editoras, muitas tradicionais, com anos de mercado, ainda veem o livro como um produto de papel, o que impede que as empresas do setor aceitem a gradual mudança que vem ocorrendo. E vai mais além: a grande revolução permitida pelo e-book é a facilidade de socializar o conhecimento. E compara:

– Vivemos uma nova transformação gutenberguiana. Aquilo que Gutenberg fez com seus tipos móveis mudou o mundo. Não pela técnica em si, mas porque essa técnica foi capaz de reduzir drasticamente os custos do acesso ao conhecimento e a novas ideias que antes estavam isoladas e fragmentadas. Socializou, assim, o conhecimento clássico e abriu as portas para novas ideias.

Os usuários de e-book já descobriram algumas de suas vantagens. Com um bom leitor eletrônico, é possível armazenar uma vasta biblioteca em um único lugar, além de permitir que o usuário tenha acesso a ela em qualquer lugar que esteja. Ou seja, praticidade, portabilidade e economia de espaço são os maiores atrativos para quem ainda está em dúvida sobre valer a pena adquirir um e-book.

Outro fator que ainda impede as editoras de investirem pesado no livro digital é, claro, o aspecto financeiro. Segundo Linares, não é possível achar que as faixas de lucro vão ser as mesmas das vendas de livros tradicionais:

– Hoje o público de vanguarda está comprando leitores (e-readers/tablets) e já consumindo no Brasil. É um público pequeno ainda, mas é o que consome mais e logo exigirá o que consumir. Seja ele professor universitário, leitor modista radical, pessoas da área de tecnologia ou advogado consumidor de livros jurídicos pesados que não quer carregar na mala.

Não há dúvida de que os e-books transformam a experiência da leitura. Longe de extingui-la, eles permitem uma nova interação entre leitor e livro. Seria possível imaginar, num futuro não muito distante, e diante de tantas inovações tecnológicas que se nos apresentam, que o leitor talvez até possa interagir diretamente com a história, montando-a e desmontando-a de acordo com suas preferências, seus pontos de vista. Por exemplo: “não gostei deste personagem, vou deletá-lo da história”; ou: “acho que este personagem aqui está subaproveitado, vou fazê-lo crescer daqui por diante, ele terá mais voz ativa” etc. Ou ainda: “a trama está morna, vou acrescentar detalhes mais picantes”. E por aí vai...

(Artigo publicado originalmente na revista Caderno 0, em setembro de 2011)

Logotipo oficial

É com muito orgulho que apresento o logotipo oficial do blog, gentilmente criado pelo amigo Jorge Ney Valentim, ilustrador de primeira linha (ou seria primeiro traço?), grande profissional com quem tive a honra de trabalhar no ano passado. Só os imbecis de iniciais repetidas não sabem reconhecer seu talento, que ajuda a abrilhantar mais ainda este espaço.
Quem quiser conferir o trabalho do Jorge, pode clicar aqui: www.jorgeneyvn.blogspot.com
Obrigadão, Jorge!

A difícil vida fácil à francesa


Fiquei surpreso ao ler a crítica altamente favorável deste filme, L’Apollonide – Os amores da casa de tolerância, que passou meio sem alarde pelo último Festival do Rio e entrou em cartaz no restrito circuito de arte da cidade. Fiquei animado para conferi-lo, mas aí tive outra surpresa, ainda maior que a primeira, ao ver que o diretor era o mesmo Bertrand Bonello, cujos filmes anteriores não eram bons cartões de apresentação. Para quem não liga o nome à pessoa, Bonello fez antes o chatíssimo O pornógrafo, em que o pobre do Jean-Pierre Léaud, um monumento do cinema francês, passa hora e meia filosofando sobre nada enquanto tenta obter recursos para rodar sua nova produção – pornô, como indica o título; e Tirésia, uma fita muito esquisita sobre um transexual que é seqüestrado e tem os olhos perfurados – a curiosidade é que ambos os papéis eram interpretados por brasileiros, Clara Chevoux e Thiago Teles. Meu ânimo, então, arrefeceu. Pensei: “Poxa, ir ao cinema pra ver um filme do cara que fez O pornógrafo? Haja paciência! Será que vou dormir na sessão?” Mas o cinéfilo é antes de tudo um aventureiro. Então, me enchi de coragem e lá fui eu.
L’Apollonide – Os amores da casa de tolerância conta a história dos últimos dias de funcionamento do prostíbulo homônimo, na Paris do começo do século XX. Acompanhamos o triste e tedioso cotidiano das profissionais que trabalham lá, nenhuma especialmente bonita ou interessante – com duas honrosas exceções, a jovem Léa (Adele Haenel), que diz a que veio logo em sua primeira cena, em que se despe e se mostra linda, saudável e depilada; e Samira, interpretada por Hafsia Herzi, que já conhecia de O segredo do grão do Kechiche, esse sim um grande filme. Mas não temos tempo para conhecer as histórias de vida de cada uma delas, mal sabemos seus nomes, elas mal existem como figuras humanas: apenas estão ali, ocupando seus lugares no tempo e no espaço, existindo simplesmente, já que não é vida o que elas têm no L’Apollonide. Nesse sentido, a protagonista fica sendo Madeleine (Alice Barnole). É dela quem ficamos sabendo um pouco mais. Marcada pela tragédia, Madeleine teve o rosto desfigurado por um cliente, que lhe cortou os cantos da boca e a condenou a passar o resto de sua vida miserável ostentando um sorriso macabro e doloroso. A cena em que ela aparece coberta de sangue, amarrada na cama, berrando de dor e desespero, é uma das mais assustadoras do cinema recente. É dela também outra cena antológica, quase ao final, em que sua personagem literalmente chora lágrimas de esperma.
A sessão a que fui, no pequeno e simpático Cine Jóia, estava lotada, mas algumas pessoas foram saindo lá pelo meio em diante, não sei se aborrecidas com a lentidão da narrativa ou incomodadas pela crueldade da história. Porque, gostem ou não, é preciso reconhecer que o filme é cruel, duro, por vezes difícil. Não há esperança, não há sequer um sopro de escapatória para aquelas meninas: todas estão inexoravelmente condenadas a repetirem um corolário de sofrimentos, sabendo que nada vai mudar – e o fato de todas terem consciência disso torna tudo ainda mais melancólico. Aqui e ali ainda se escuta uma ou outra revelando o sonho de casar com um cliente, de se mudar para outro país, mudar de vida, mesmo sabendo que tudo não passa de ilusão, de combustível adulterado utilizado para seguir com o bonde que não se chama desejo. Não há sequer erotismo no filme, e quem pensar em assisti-lo interessado em detalhes ginecológicos vai desistir nos primeiros 15 minutos. Uma ou outra cena mostra a sugestão de uma transa, outras se demoram um pouco mais, como a seqüência da boneca. Mas o sexo, ali, é podre, sujo, sórdido. Tudo é realçado pelos aspectos técnicos do filme. A direção de arte recria com perfeição o período retratado, reforçado pelos figurinos e a fotografia magnífica. A trilha sonora consegue a proeza de combinar temas alegres clássicos e contemporâneos a cenas de uma melancolia ímpar, acentuando o clima de angústia.
No fim, L’Apollonide – Os amores da casa de tolerância acaba ficando num meio-termo. Está longe, muito longe, de ser a obra-prima vendida pela crítica, mas também está acima, bem acima, dos trabalhos anteriores de Bonello, o que talvez nem queira dizer muita coisa. Vale, porém, uma conferida atenta.

sexta-feira, 23 de março de 2012

O filho rebelde se perdeu no mundo e agora retorna

Dizem que somente damos valor a alguma coisa depois que a perdemos. Nos últimos 11 meses, pude comprovar essa teoria na prática. Por motivos pessoais e profissionais, precisei me afastar da literatura e de tudo o que a cerca, paralisei minha produção intelectual e mesmo as críticas de cinema, que vinham sustentando meu vício pela escrita, tiveram sua frequência diminuída. Só não parei de ler porque isso é, para mim, tão fundamental quanto respirar, beber água ou comer. É uma necessidade vital.

Quem me conhece sabe de minha paixão pela literatura. Não tem explicação. Sempre foi mais que uma distração, chega a ser vício. Preciso me envolver com ela de alguma forma. Só ler, às vezes, não me basta, é um exercício incompleto. Preciso criar, verbalizar o que sinto. A literatura, muitas vezes, me tem uma função terapêutica: muita barra pesada já suportei apenas pela facilidade de poder segurar uma caneta e jogar idéias no papel. Admiro todas as formas de arte – pintura, escultura, dança, teatro – mas a literatura é soberana. Aprendi a ler antes de falar. Não sabia ainda pronunciar "papai" ou "mamãe", mas identificava o nome do Pato Donald nas revistas em quadrinhos que lia. Mesmo o cinema, que vem ocupando um lugar de destaque na minha vida nos últimos 20 anos, não se compara ao que a literatura representa para mim. Esta é o meio pelo qual consigo expor minhas opiniões sobre aquele. São expressões artísticas que se combinam, uma sem a qual não seria possível existir a outra. Tudo começa e termina na literatura.

Criei este blog em 2009, com o intuito de discorrer sobre filmes, mas o abandonei pouco tempo depois, já que ninguém lia (e o que me garante que será lido agora?). Só que o tempo passou e fui sentindo crescer essa necessidade imperiosa em todo homem de Letras, qual seja, escrever, escrever e escrever. Bem ou mal, não importa. Alcançando ressonância ou morrendo no ciberespaço da indiferença. Escrevendo para mim ou para quem quiser ler. Não faz diferença. É um espaço meu, do qual preciso, e que pretendo reativar a partir de agora, reformulado. Antes, somente críticas e crônicas breves sobre a Sétima Arte; agora, textos variados sobre tudo, sem esquecer, claro, a ficção, outra mola propulsora de minhas vadiagens intelectuais.

Precisei me afastar para de fato perceber o quanto a literatura é importante para mim. Há uma necessidade urgente de escrever, de botar tudo pra fora, de criar – enfim, há uma necessidade. Maior do que eu.

Tudo clichê. Algo rançoso. Meio adolescente, talvez. Mas é fato. Estou de volta ao lugar de onde nunca deveria ter saído.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Preparando a volta

Em breve, novidades neste espaço.
Mais textos, mais diversidade temática, mais interatividade (mas aí já não é mais comigo).
Aguarde! (Tem alguém aí para aguardar?)