Os emigrantes (1971) |
Em 2012, O artista se tornou o primeiro filme de outro país a ganhar o Oscar
(digam o que quiserem, mas trata-se de uma produção francesa, ainda que tenha
sido rodada nos Estados Unidos, com elenco secundário e membros da ficha
técnica ianques). Antes dele, apenas outros três filmes ao longo da história
haviam tentado a proeza, sem sucesso. A primeira vez foi com o clássico A grande ilusão, de Jean Renoir (1940). Trinta
e quatro anos depois, Ingmar Bergman emplacou Gritos e sussurros entre os cinco finalistas. E poucos anos antes,
em 1972, outro filme sueco conseguiu angariar a simpatia de Hollywood e
disputou o Oscar em pé de igualdade com as produções locais: Os emigrantes, dirigido por Jan Troell,
acabou esquecido pelo tempo, mas é um belo retrato de época. E mostra como o
sonho americano da terra prometida pode ser mesmo uma maldição para alguns
aventureiros.
Em 1844, o casal Karl-Oskar e
Kristina vive em Ljuder, um pequeno povoado rural no interior da Suécia. Eles
dispõem de um pedaço de terra no qual plantam e colhem o sustento, mas o solo é
praticamente infértil e rende poucos produtos. Quando dois dos filhos quase
morrem de fome, eles passam a considerar a possibilidade de se mudarem para
viver nos Estados Unidos, o Novo Mundo que representa possibilidades e
esperança. Uma das moradoras do vilarejo reforça a idéia, já que tem um filho
que reside na América e encontrou a bem-aventurança, de acordo com as cartas
que recebe do rapaz. O casal se junta a outros agricultores na mesma situação e
empreende uma jornada de fé durante dias a bordo de um navio. Mas ainda há
muitas dificuldades no trajeto do grupo. Afinal, todos são chamados, mas poucos
serão os escolhidos, máxima religiosa que se materializará ao longo da viagem.
Liv Ullmann: primeira indicação ao Oscar. |
Assistir a Os emigrantes é se transportar a um mundo que não existe mais, em
todos os sentidos, sobretudo nos aspectos ligados ao cinema como um todo. É um
tipo de produção que não se faz mais, embora ainda tivesse campo naquela época.
As platéias de hoje, formadas em sua maioria por espectadores jovens, pedem um estilo mais dinâmico de narrativa, e produções
desse formato, se ainda não desapareceram completamente, estão próximas da
extinção. A narrativa lenta reforça o caráter épico conferido ao filme, que, ao
longo de seus 184 minutos de duração, é grandemente sustentado por cenas
contemplativas, realçando o aspecto psicológico dos personagens. É interessante
observar como o discurso religioso trespassa todo o filme, desde as raízes
locais dos moradores, que pautam seu estilo de vida pelo viés eclesiástico,
seguindo o que determina a Igreja, de forte presença na comunidade, até a
simbologia da dispersão de um povo sofrido em busca da terra prometida. Como os
judeus que encontraram privações em sua diáspora, o grupo de viajantes suecos
precisa superar as adversidades de uma odisséia sem garantias de final feliz,
mas tendo a esperança como norte de sua empreitada.
Max Von Sydow é um dos emigrantes. |
A viagem é pontuada por cenas
tensas, como a discussão entre Kristina e uma das viajantes, em que a primeira acusa a outra de estar com
piolhos e, portanto, seria uma ameaça aos demais viajantes, com uma ou outra
tirada cômica para aliviar, o que é bem representado na parte em que o casal
jovem tenta aprender inglês. No todo, porém, prevalece a austeridade narrativa,
sustentada pela bela fotografia que realça o aspecto da epopéia empreendida
pelo grupo. O final é simbólico e emocionante.
O filme concorreu a quatro Oscars:
além da categoria principal, foi indicado ainda para diretor, atriz (Liv
Ullmann, na primeira das duas nomeações que recebeu; a segunda foi por Face a face de Bergman, em 1977) e roteiro
adaptado. Mas não ganhou em nenhuma. Mesmo assim, fez sucesso suficiente para
justificar uma continuação - naquele tempo, as continuações ainda eram feitas com
propósito artístico e não por influência financeira mercadológica - que o próprio
Troell dirigiu no ano seguinte, O preço
do triunfo. Tanto um quanto outro foram esquecidos pelas distribuidoras e
jamais lançados em formato caseiro no Brasil. Uma pena.
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