Não (2012) |
Entre o final dos anos
80 e meados dos 90, o mundo assistiu a uma série de transformações sociopolíticas
que alteraram de forma indelével as configurações da história como conhecíamos.
Entre tais eventos, os mais emblemáticos foram a queda do Muro de Berlim, a
desintegração da União Soviética, que, por tabela, gerou o esfacelamento do
regime comunista na Europa Oriental, e a Guerra da Bósnia, um dos episódios mais
sangrentos do século XX. Naquela época, a TV a cabo ainda engatinhava no
Brasil, telefone celular era um luxo para os mais abastados e a internet estava
embrionária. As pessoas assistiram a tudo apenas pela televisão e só dispunham
dos jornais e revistas para se informar. Em meio a esse vendaval de mudanças,
uma que ficou quase no rodapé da história, e que eu, confesso, nem me lembrava
mais, teve vez aqui perto, no vizinho Chile.
Em 1988, o governo
ditatorial do general Augusto Pinochet autorizou a realização de um plebiscito,
por meio do qual o povo escolheria entre a continuidade do governo totalitário
e a renovação democrática. É neste panorama que se desenvolve a trama de Não (ou No, como preferiu a distribuidora, descartando a tradução), um dos
finalistas ao Oscar de Filme Estrangeiro deste ano - já expliquei, sei que a
denominação é errada, mas não consigo chamá-la de outra forma. Não deve levar
(a estatueta já é praticamente do Amor de
Michael Haneke), mas é um concorrente digno e que merece a atenção.
René Saavedra (Gael García Bernal): a ditadura cansa. |
O "não" do
título significa a opção pela abertura democrática, em oposição, obviamente, ao
"sim", que decretaria a permanência de Pinochet, que já contava quase
15 anos à frente do poder, período durante o qual lançou o país em trevas,
violência generalizada e todo aquele aparato próprio das ditaduras. É pelo
"não" que um grupo de publicitários é contratado para criar uma
campanha de televisão, de forma a convencer a população local. Eles estão
sozinhos contra todos; sabem de antemão que o plebiscito é um blefe, uma jogada
política de Pinochet apenas para legitimar o sistema vigente para o resto do
mundo. Mesmo assim, guiados pelas convicções de cada um, não esmorecem e buscam
criar a melhor campanha possível. É a contribuição que podem dar para a
reconstrução do Estado democrático. À frente desse grupo, está René Saavedra (Gael
García Bernal, em outra boa composição), que tem motivos pessoais para se
empenhar por uma vitória pelo "não", já que sua mulher é uma ex-presa
política que acabou de ser libertada. Ambos têm um filho pequeno e é nele que
se projeta a imagem de um Chile futuro e esperançoso, bafejado pelos ventos da
mudança.
O diretor Pablo Larraín
vem se firmando como um dos principais realizadores do cinema latino-americano
e confirma seu talento na condução dessa história que combina habilmente tensão
e drama político. Longe do suposto panfletarismo que tal tema suscitaria, o
roteiro, escrito por Pedro Peirano (da série local 31 minutos) e baseado na peça O
plebiscito, de António Skármeta, abre a discussão e dá voz aos dois lados,
embora, inegável e obviamente, com simpatia pela causa democrática.
Uma das campanhas pelo "não": a alegria está chegando. |
A exemplo do que fizera
em seus trabalhos anteriores, Tony Manero
e Post mortem, em Não Larraín mescla ficção e realidade
por meio da inserção de imagens documentais, inclusive apresentando as
verdadeiras campanhas pró-"não" que foram veiculadas na televisão
chilena, mostrando um suposto making of produzido pela equipe. Todas são criativas
e até emocionantes. Mesmo sendo referentes a outro país, dão orgulho e causam
simpatia a quem assiste, ganhando ainda mais pontos em contraste com as pobres
mensagens oficiais que também são mostradas.
No elenco, ainda estão
Alfredo Castro, ator preferido de Larraín e que esteve em seus trabalhos
anteriores, Néstor Cantillana (da série Prófugos) e Luís Gnecco (idem e que esteve no
recente A dançarina e o ladrão). Um filme que confirma a boa qualidade dos indicados deste ano.
Esse filme parece tão bom! Quero vê-lo!!
ResponderExcluir(E sigo não entendendo porque você não faz comentários do que vê no Cinema Fantástico. tsc, tsc, tsc...)
Beijão, boa sexta-feira.
Sheila, é pra chamar o povo pro meu blog (rs).
ResponderExcluirBeijão - bom final de semana.