quinta-feira, 24 de abril de 2014

Ensaio para os grandes musicais

Cavadoras de ouro (1933)
Tão logo houve o surgimento do cinema sonoro e Hollywood não perdeu tempo. Tratou de explorar todas as potencialidades que a nova tecnologia oferecia, produzindo musicais a granel. Embora feitos mais na base do entusiasmo da novidade, sem muita preocupação estética e quase nada de refinamento, alguns dos exemplares produzidos nos anos 30 têm certas qualidades.

Este Cavadoras de ouro, de 1933, já me surpreendeu logo de cara, porque foi o primeiro de uma série que se estendeu até 1938, guardando também conexões com outros filmes da época que contavam histórias similares. Ou seja, quase 80 anos atrás, Hollywood já produzia histórias em seqüência, porém, com propósitos muito diferentes dos interesses puramente mercadológicos de hoje. Todas tiveram a supervisão do grande Busby Berkeley na concepção das coreografias e números musicais, o que é mais uma vantagem dessas sobre as continuações esvaziadas que se produzem atualmente.

A história se passa durante a Grande Depressão, em 1930. Quatro dançarinas que dividem um apartamento se vêem subitamente desempregadas depois que o teatro no qual  se apresentavam é fechado pela polícia. Cogitam conseguir emprego em outras áreas, afinal, não havia muito o que escolher naquela época, mas ganham novo alento graças ao namorado de uma delas, um compositor também em busca de uma chance, que aceita financiar um espetáculo, desde que seu nome seja mantido em sigilo, porque a família desaprova seu envolvimento no mundo das artes e pensa que ele se tornou médico. Entre um ensaio e outro, paixonites irão surgir e confusões terão vez.

Ginger Rogers sempre foi uma atração.
Não se espere um espetáculo grandioso de canto e dança. As marcas características dos grandes musicais só apareceriam a partir da década seguinte. O forte do filme são os diálogos bem-humorados e muito espirituosos, emoldurando uma profusão de piadas verbais. De musical mesmo, há muito pouco. A abertura acompanha um dos números apresentados pelas dançarinas no teatro, momentos antes de a polícia invadir o local para fechá-lo, sob protestos do proprietário. Pouco depois, Dick Powell defende uma canção ao piano, quando convence o produtor a apostar nele para arriscar outro show. E os 20 minutos finais são tomados pela apresentação do novo espetáculo. Nada muito elaborado, mas já dá para notar o começo de um estilo que seria melhor desenvolvido na década seguinte, como uma curiosa tomada aérea das coreografias no palco e um número especialmente bonito com os violinos fosforescentes.

Cavadoras de ouro recebeu uma indicação ao Oscar, na categoria Melhor Som (perdeu para Adeus às armas), foi seguido por Mordedoras (1935, o único do lote a ganhar um Oscar, pela canção "Lullaby of Broadway"), Cavadoras de ouro de 1937 (que na verdade foi rodado em 1936! Também é estranho que seja este o único dos quatro volumes lançados em DVD por aqui, pela sempre suspeita Continental, pelo selo Vintage) e Cavadoras em Paris (1938), que conclui a odisséia das dançarinas em busca de fama e fortuna na capital francesa. Mas não há preocupação em se construir personagens de uma história para outra porque o elenco muda a cada novo capítulo.

Por exemplo, Dick Powell esteve à frente das três primeiras partes, mas interpretando personagens diferentes em cada uma delas. A loura Joan Blondell foi sacada da segunda história, mas reaparece na terceira, também com outro personagem - ou seja, a série valia mais pelo nome do que por qualquer tipo de coesão narrativa entre os filmes. Também a futura estrela Ginger Rogers só deu as caras aqui, seguindo depois em projetos mais ousados e interessantes, tornando-se a maior parceira de Fred Astaire em musicais clássicos como O picolino (1935). Só Busby Berkeley esteve envolvido nos quatro filmes, sendo que assinou a direção de Mordedoras.

Fãs de musicais vão gostar de descobrir este pequeno e simpático exemplar dos primórdios do gênero. Nada de especial, mas assiste-se com prazer.

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