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Segurança nacional (2010) |
Em uma das entrevistas apresentadas nos extras do DVD, o protagonista
Thiago Lacerda assim define o filme: "Segurança nacional é um
filme de ação feito de brasileiros para brasileiros". Mesmo verdadeira e
autêntica, a frase acaba funcionando como uma piada pronta, porque algum gaiato
pode dizer: "É por isso que não presta!". Mas a verdade é que essa
produção precisa ser vista com certo afastamento crítico para ser melhor
aproveitada.
Quando foi lançado nos cinemas, em 2010, Segurança nacional foi
inapelavelmente demolido pela crítica especializada, que lhe apontou os mais
variados defeitos, desde o roteiro absurdo e inverossímil até as cenas de ação
fracas e constrangedoras. Deixei para ver o filme agora, e se não estamos
diante de uma obra-prima do cinema nacional, tampouco ele pode ser classificado
como um desastre completo. Há coisas muito mais canhestras no cinema tupiniquim
do que essa tentativa de se fazer uma fita de gênero no país, algo raro,
complicado (até pela dificuldade de distribuição e aceitação junto ao público)
e, por outro lado, de uma iniciativa extremamente bem-vinda para renovação e
oxigenação do nosso cinema.
Hoje é praticamente impossível competir com as comédias em termos de
popularidade e possibilidade de renda, o que gera quase um abismo que só vem
aumentando nos últimos anos, tanto que raramente um filme de outro gênero
(geralmente um drama ou uma biografia musical) consegue furar o bloqueio e
entrar no seletíssimo grupo dos campeões de bilheteria, e nem estou falando da
casa dos milhões, porque isso restringiria ainda mais o panorama. Tão popular
quanto as comédias na preferência cinéfila dos brasileiros, contudo, o cinema
de aventura, ou de ação, como preferem alguns, já teve por aqui um porto
seguro, rendendo oceanos de dinheiro com produções estreladas por astros que se
tornaram quase íntimos do espectador médio. Falo de Bruce Willis, Stallone, Van
Damme, Arnoldão antes da política etc. Ou seja, um cenário que se anunciava
bastante promissor para quem quisesse se arriscar a pensar fora da moviola e
fazer algo diferente. Afinal, com poucas variações culturais ou cenográficas,
filmes de ação costumam ser iguais em qualquer lugar do mundo, desde que, é
claro, não se exija a excelência técnica à qual Hollywood nos acostumou e que
não tem como ser reproduzida em outas paragens. Pensamento análogo: os fãs
desse tipo de filme não se importam com sua origem, então, por que não fazermos
aqui também? A bilheteria é garantida!
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Tenente Marcos Rocha: um herói de seu povo. |
Foi talvez seguindo esse raciocínio que o jovem diretor Roberto
Carminati, então apenas um estudante de cinema, fã confesso desse tipo de
filme, resolveu se arriscar em sua segunda experiência na Sétima Arte –
estreou com o desconhecido A fronteira (2003), rodado nos
Estados Unidos. Ele mesmo escreveu o roteiro, garimpou o elenco e ousou
imaginar uma trama por vezes rocambolesca. Após a aprovação da Lei do
Abate, em 2004, que permite ao governo brasileiro derrubar aeronaves estrangeiras que
invadam o espaço aéreo nacional sem autorização, Hector Gasca, o mais temido narcotraficante
colombiano, irritado por não conseguir mais lucrar com o
movimento de suas atividades por aqui, resolve se vingar promovendo atos
terroristas em diversas capitais. Para combatê-lo, é convocado o agente Marcos
Rocha, treinado por um órgão federal que quase ninguém sabe que existe, a
Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que presta apoio a operações
militares.
Sem referências anteriores em que se apoiar, Carminati bebe na fonte dos similares norte-americanos, tanto na ambientação das cenas de luta e perseguição, quanto na construção do universo habitado pelo herói. É como se estivéssemos assistindo a uma produção B rodada em Hollywood, só que falada na nossa língua e estrelada por gente nossa. Claro que há clichês, alguns inevitáveis, como o namoro do agente com a filha de sua supervisora (Ângela Leal), praticamente mantido em sigilo das duas e que só vem à tona muito tempo depois. A garota é interpretada por Viviane Victorette, em sua estréia no cinema, mais como elemento romântico, com pouco a fazer e com direito a uma rápida ceninha de bondage (mas, curiosamente, ela tem bastante espaço nos extras, com a segunda entrevista mais longa). Milton Gonçalves é o presidente negro prenunciado por Monteiro Lobato e Gracindo Júnior, como um deputado corrupto, vive um momento que, hoje, causaria urros da platéia nas salas, quando seu personagem é seqüestrado e ameaçado de morte pelo traficante!
A má recepção do filme por público em geral e crítica em particular deve ter abortado
os projetos seguintes de Carminati, que se mostra entusiasmado nos extras, mas sem dúvida esbarrou na dificuldade de se fazer cinema por aqui, adiando ou enterrando os sonhos de uma juventude universitária idealista. Mas, visto
hoje e com um olhar mais compreensivo, Segurança nacional nada
fica a dever a outras bobagens acéfalas produzidas pelos ianques. Desligue o senso crítico e divirta-se.
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