Tenho uma regra: só aceito rever
um filme depois de passado pelo menos um ano. No caso de filmes aos quais
classifiquei com quatro ou cinco estrelas, o intervalo se amplia para de cinco
a dez anos. É para dar tempo de a história “assentar”, deixar que descanse em
algum canto da memória. Isso serve para que as qualidades de tal filme, que me
levaram a qualificá-lo como uma obra-prima, se fortaleçam. Muitas vezes é quase
como se fosse um filme inédito, já que nossa experiência cinéfila (e também de
vida) é maior. Descobrimos mais detalhes, concedemos outras interpretações... A
primeira vez seria a do impacto; a segunda, a da reflexão, da percepção, da
maturação de um filme em sua excelência. Revi Zona de conflito agora, nove anos após tê-lo visto pela primeira
vez. E todas as qualidades que vi nele na época se realçaram.
Dramas familiares existem aos montes,
mas poucos conseguem ser tão dilacerantes quanto este, de 1998, que marcou a
estréia na direção do ator Tim Roth. Apesar do ótimo resultado e da repercussão
positiva – chegou a ser indicado ao prêmio de melhor diretor no Festival de
Filmes Britânicos Independentes – , ele nunca mais se aventurou atrás das
câmeras. Pena, porque mostra aqui potencial, segurança e refinamento na
condução da história.
Ao se mudar com a família de
Londres para Devon, o tímido adolescente Tom se torna ainda mais retraído, sem
a companhia de seus amigos. Sua mãe está grávida, o pai trata a todos com
rigidez, mas também com afeto, e sua irmã mais velha o acolhe nos momentos
difíceis. Um dia, voltando das compras, Tom testemunha um fato terrível, que o
lançará em um mundo de incertezas. Contém sua revolta, até que chega um dia em
que não será mais possível guardar tanta dor. Sua angústia se transforma em ação
e explode em uma cena de forte impacto visual.
Com meia hora de filme o grande
segredo da trama se apresenta ao espectador. Mesmo assim, prefiro não revelá-lo.
A partir daí, assiste-se a um lento e doloroso estudo sobre a culpa. É um rito
de passagem dos mais escabrosos, pontuado pela fotografia que valoriza as
belíssimas locações externas e por um ritmo contemplativo, lembrando por vezes
os dramas existenciais de Bergman.
Roth extrai o máximo de seu
elenco. Tilda Swinton dispensa apresentações e muitos anos antes de se mudar
para Hollywood já era a atriz de fartos recursos dramáticos que hoje o grande
público conhece. Ray Walstone confere amedrontadora veracidade à figura do pai
ambíguo. Também construiu carreira sólida nos Estados Unidos (Sexy beast, A proposta, recentemente em A
invenção de Hugo Cabret, entre muitos outros). Ironicamente, o casal de
filhos, interpretados por dois estreantes no cinema, parece ter sido mesmo vítima
de maldição familiar, já que nenhum dos dois fez nada de relevante depois. Freddie
Cunliffe, que faz o atormentado adolescente, limitou-se a curtas e telefilmes
sem importância, empacando a carreira em 2008. A bela Lara Belmont ainda
se arriscou em Hollywood com o fraco terror O
jogo dos espíritos, de 2001, mas também não alcançou o estrelato que se esperava. Ainda
na ativa, igualmente se limitou a produções menores (séries, curtas). Ambos transmitem, apenas com o olhar e expressões faciais, toda a complexa rede de desespero e dor silenciosa que seus jovens personagens
experimentam. São grandes trabalhos
de composição. Curiosidade: Colin Farrell, bem novinho, faz uma ponta (nos créditos finais, assina com um "J." entre seus dois nomes).
O título original, “The war zone”,
o mesmo do romance de Alexander Stuart, não publicado no Brasil, em que o roteiro se
baseia, faz crer que se trata de um drama de guerra. Mas, na verdade, a guerra
maior e mais sofrida é travada mesmo dentro de casa. Com feridas incuráveis. Um
filme obrigatório, para ser conhecido ou redescoberto. Inclusive pelas
distribuidoras, que despejam tanta besteira nas locadoras, mas nunca se tocaram
de lançar este aqui em DVD.
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A partir dessa semana, as postagens aqui no CineComFritas serão feitas apenas às quintas-feiras. É para dar mais visibilidade a alguns textos, que antes ficavam "espremidos" no final de semana. Porém, na época do Festival do Rio (28 de setembro a 11 de outubro), as postagens podem voltar a ser diárias, ou quase.
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A partir dessa semana, as postagens aqui no CineComFritas serão feitas apenas às quintas-feiras. É para dar mais visibilidade a alguns textos, que antes ficavam "espremidos" no final de semana. Porém, na época do Festival do Rio (28 de setembro a 11 de outubro), as postagens podem voltar a ser diárias, ou quase.
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