Interessante
como um filme pode mudar tanto no nosso conceito passados alguns anos depois de
o assistirmos pela primeira vez. Alguns melhoram, mas chega a ser constrangedor
percebermos como certos títulos que nos empolgaram outrora simplesmente não resistem
a uma revisão.
Foi
no ano de 2000 que descobri este Meu
namorado é de morte na TV aberta. Na ocasião, dei quatro estrelas para ele, achei
extremamente engraçado, criativo, cheio de referências. Por muito tempo figurou
na minha lista de melhores filmes menos conhecidos. Guardei a experiência nos
recônditos da memória e, como geralmente acontece, nunca o revi. Dia
desses topei com uma reprise na TV a cabo e me aventurei enfim a conferi-lo de
novo. Saí decepcionado e, mais ainda, intrigado: afinal, o que eu tinha visto
ali?
A
primeira surpresa foi saber que o filme tem outro título nacional, ao que
parece, o oficial com o qual foi lançado em VHS e também exibido de vez em
quando na TV a cabo: Namorado gelado,
coração quente!, assim mesmo, com ponto de exclamação e tudo. A premissa é
mais do que explorada pelo cinema norte-americano. Rapaz tímido e atrapalhado
mantém uma paixão secreta pela menina mais bonita da turma, de quem, por coincidência, é
vizinho desde criança, só que nunca teve coragem de se declarar. Quando se
aproxima a noite do baile de formatura, ele pensa em convidá-la, e chega a
armar um plano, com a ajuda do melhor amigo, para impressioná-la, e, assim,
fazer com que ela desista de ir com seu namorado, o valentão da escola. Só que
o plano dá errado e o mancebo morre. Ao chegar no céu, ele descobre que sua
morte foi um engano e que terá uma segunda chance. Ele então volta ao mundo
terreno disposto a conquistar sua amada. Com um detalhe: agora, ele é um
morto-vivo.
O
filme é apresentado como se o espectador estivesse lendo uma história em
quadrinhos, com cenas desenhadas e alguns cortes simulando o virar das páginas,
um recurso do qual, infelizmente, o diretor parece se esquecer na maior parte
do tempo, não o utilizando com a freqüência imaginada. Não há preocupação de
problematizar coisa alguma, é só uma bobagem adolescente que a gente vê e
esquece (hoje eu digo isso, mas na época eu sairia indicando o filme para todo
mundo!); forçando a barra, dá para enxergar uma mensagem romântica por trás da
obviedade do roteiro, de que a força do amor é capaz de fazer superar tudo, até
a morte. Mas não acho que algum espectador vá se interessar em perceber tal
sutileza. Considerando o público-alvo para o qual é endereçado, no entanto,
acaba sendo uma diversão inofensiva, sem muitas baixarias, embora traga algumas
piadas mais grossas, como quando o herói percebe que seu corpo está apodrecendo
e se desfazendo, e há as conseqüências imaginadas. Há boas tiradas de humor
negro, como quando o rapaz reaparece na casa dos pais e todos o tratam como se
estivesse tudo bem, mesmo sabendo que ele está morto! Ou ainda quando a mãe
rouba corpos no cemitério e os guarda na geladeira para que o filho possa se
alimentar. Amor de mãe não conhece limites mesmo.
O
grande barato acaba sendo observar o começo de carreira de dois futuros astros.
O namorado valentão da garota é interpretado por Matthew Fox, ele mesmo, o
eterno Dr. Jack de Lost, série que,
ao que parece, livrou o ator da condenação de repetir sempre o mesmo tipo de
personagem bad boy. É sua estréia no cinema, em papel temporão (já estava com
27 anos!), após começar fazendo algumas participações em séries de TV. Como
todo brucutu que se preza, é claro que ele tem um "capanga"
mal-encarado para bater e fazer medo nos alunos menos populares da escola. A incumbência cabe a Philip Seymour Hoffman (sem o nome do meio nos créditos),
futuramente consagrado pelo Oscar por Capote
e reconhecido como um dos grandes intérpretes de sua geração. E não é que o seu
físico parrudo poderia mesmo tê-lo condenado a personagens similares? Escapou
graças ao talento.
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Capote e Dr. Jack barbarizavam na juventude. |
Já
o casal protagonista não teve o mesmo sucesso. Andrew Lowery esteve em A cor da noite, do ano seguinte, e
limitou-se a rodar telesséries sem maior importância, encerrando a carreira em
2003. Já a bela Traci Lind pode se orgulhar de ter um Wenders no currículo (O fim da violência, 1998) e nada mais.
Também se aposentou um pouco mais tarde, em 2007. Ou seja, o romance entre a
patricinha e o zumbi acabou em maldição!
A
idéia original do filme foi praticamente reaproveitada no recente e horrível Meu namorado é um zumbi, lançado ano
passado. Ao final, subtraí uma estrela da minha primeira qualificação (só não
faço isso quando o filme recebe a cotação máxima) e fiquei pensando que já fui
um cinéfilo muito mais aberto a surpresas. Deve ser uma conseqüência natural da
idade. Ou vai ver eu é que estou ficando muito chato.
Este nunca vi mas adoro rever filmes do tempo em que tinha tempo pra acompanhar a Sessão da Tarde. Algumas vezes me decepciono mas, normalmente, eu baixo meu nível de exigência. rsrs
ResponderExcluirSheilinha, saudades de você aqui :). Eu normalmente mantenho minhas impressões iniciais quando revejo um filme, mas este realmente me decepcionou. Acho que depois de ver tanta coisa parecida, o que nos pareceu inteligente e criativo perde um pouco do impacto.
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