Estamos sempre criticando a mania
que Hollywood tem de refilmar obras originais de outros países, quase sempre
com resultado inferior, seja porque tal artifício evidencia a falta de
criatividade para se escrever histórias novas (é melhor aproveitar algo que já
existe e reciclá-lo para o cenário local), seja pela distorção conferida a
inúmeros aspectos culturais da trama. Mas o feitiço também vira contra o
feiticeiro e, neste filme de título comprido e curioso, Uma mulher, uma arma e uma loja de macarrão, temos o inverso: uma
refilmagem oriental de um filme norte-americano, no caso, Gosto de sangue, que marcou a estréia dos Irmãos Coen, em 1984.
O nome por trás da ousadia é
Zhang Yimou, um dos maiores diretores chineses e o principal realizador daquele
país na atualidade. Um mestre no manejo de cores, luzes e movimentos, ele tem
cacife para fazer o que quiser. São dele alguns dos filmes mais bonitos dessa primeira
década do século, como Herói, O clã das adagas voadoras, A
maldição da flor dourada, todos dotados de um visual belíssimo, e o mais
recente, e também deslumbrante, A árvore
do amor. Este seu novo projeto, o mais francamente comercial de sua
carreira, acompanha a qualidade dos demais, destacando-se por se tratar de uma
comédia, gênero no qual ainda não havia se aventurado. O resultado é bastante
satisfatório.
O roteiro segue a mesma estrutura
narrativa do filme dos Coen, com um ou outro pequeno detalhe modificado (fora,
evidentemente, o fato de ser rodado na China, ou seja, com o tempero local!). A
mulher do dono de um restaurante de macarrão começa a ter um caso com um
funcionário novo. O marido descobre e contrata um pistoleiro para dar fim aos
dois, mas as coisas tomam um rumo inesperado.
Há cenas que remetem diretamente
ao clássico original dos Coen (como a do corpo sentado na cadeira deixando o
sangue escorrer; as tomadas por cima) e uma dose de bom humor que não existe na
versão norte-americana, afinal, não se pode esquecer que se trata de uma
comédia. Ou seja, Yimou não só presta uma homenagem aos irmãos diretores, mas
também reconta do seu jeito a história.
O filme foi exibido no Festival
do Rio e, estranhamente, não encontrou espaço no circuito exibidor, saindo
direto em DVD. Talvez
para compensar, a distribuidora caprichou na edição, que chega com quase duas
horas de extras, mostrando a preparação do elenco, as cenas de ação, entre
outros destaques, todos legendados (o que não é muito comum partindo da Sony).
Mas desperdiçou uma grande sacada ao traduzir o título original ao pé da letra
– poderia muito bem ter ficado “Gosto de sangue e macarrão”!
Se Hollywood quase sempre estraga
os filmes que se mete a recriar, aqui vemos que o inverso dá certo.
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