segunda-feira, 30 de abril de 2012

Confissões de um seriemaníaco - I


Alguém já disse que as séries de TV são a novela do século XXI. Se isso é verdade, então sou um noveleiro de primeira linha. Gosto muito, acompanho várias ao mesmo tempo, baixo episódios da internet quando não consigo ver na televisão. Bem que tento me segurar, mas não consigo. É um vício insanável. E, se analisarmos bem, as séries de TV hoje estão em nível bem melhor que o cinema norte-americano. O que se comprova com a migração de alguns astros e estrelas da sétima arte para o universo televisivo – Dustin Hoffman, Nick Nolte, Anjelica Houston, por exemplo, dão expediente na telinha. Hoje inicio uma leva (eu ia escrever “série”, mas seria um trocadilho muito idiota) de artigos e colunas abordando as séries que assisto – leva que pode aumentar gradativamente, à medida que eu for descobrindo outras atrações e me tornando fiel a elas.

ALCATRAZ
Onde e quando: Warner, primeira temporada encerrada.
Estrelas: Sarah Jones, Jorge García e Sam Neill.
Sinopse: No dia 21 de março de 1963, a prisão de Alcatraz foi oficialmente fechada. Os 306 prisioneiros que lá cumpriam pena deveriam ser transferidos para outras unidades carcerárias, mas desapareceram no trajeto, junto com os guardas que os escoltavam. Cinqüenta anos depois, eles começam a reaparecer, um por um, praticando os mesmos delitos de antes. Com um detalhe intrigante: têm a mesma aparência, como se o tempo nunca tivesse passado. Uma policial investiga o mistério, tendo como ajudante um professor nerd.



Por que ver: A mesma turma que fez Lost voltou a se reunir na tentativa de reeditar aquele sucesso: J.J. Abrams na criação da idéia, Jack Bender na direção de alguns episódios e Elizabeth Sarnoff produzindo. Ou seja, a série já nasceu com selo de qualidade. Também reeditaram a parceria com o gorducho García, inclusive conferindo-lhe um personagem com certas semelhanças ao seu inesquecível Hurley. Tudo isso facilita a empatia por parte do público, que acompanha a série como se estivesse reencontrando velhos amigos. O ponto de partida é original e deixa no ar a pergunta: o que, afinal, aconteceu naquele dia? A cada semana, novas revelações vão sendo feitas, mantendo o clima de suspense e tensão o tempo todo. Ótima fotografia em tons escuro-azulados realça o clima sombrio da narrativa.
Por que não ver: Por mais que tentem, vai ser difícil criar um novo Lost, como foi a intenção inicial dos envolvidos no projeto. Alcatraz é bem-intencionada em relação a isso, mas é só. O mistério até se sustenta, mas as explicações ficam longe das teorias conspiratórias que faziam o sucesso daquela série. Além disso, erraram ao dar a Jorge García um personagem muito semelhante ao Hurley, no caso, aqui, ele é um professor fanático por cultura pop (curte games e quadrinhos) que acaba sendo envolvido na investigação, já que teria escrito um livro sobre a ilha de Alcatraz anos antes. Os produtores devem ter percebido esse erro de composição e atenuaram algumas de suas características pouco depois de a série começar, certamente por rejeição do público. A estrutura narrativa repetitiva também cansa: primeiro, apresenta-se o criminoso nos anos 60, corta para o tempo atual e dá-se início à busca para prendê-lo. Com tudo isso, Alcatraz não é ruim. Dá para ver, gostar e até acompanhar com interesse. Mas não sai da escotilha.

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Fritas no cardápio


OS VINGADORES – Para muitos espectadores, esta é a estréia mais aguardada do ano, sobretudo para aqueles que são grandes fãs de HQs e filmes de super-heróis. Depois de produzir aventuras individuais de cada personagem de sua imensa galeria, a Marvel resolveu reunir boa parte deles em um único longa-metragem. A grande sacada foi escalar os mesmos atores para os papéis que já haviam interpretado antes em aventuras isoladas. Assim, Robert Downey Jr. volta a envergar a armadura do Homem de Ferro, Chris Hemsworth levanta outra vez o Mjolnir do Thor e Chris Evans torna a empunhar o escudo do Capitão América. A exceção foi o Hulk de Edward Norton, que aqui ficou sendo defendido por Mark Rufallo. 


A esta equipe juntaram-se a Viúva Negra (Scarlett Johansson) e Hawkeye (Jeremy Renner). A trama em si pouco importa, já que os fãs e espectadores em geral querem mesmo é ver os heróis em ação. E certamente sairão satisfeitos, já que o filme se estende por quase três horas de cenas movimentadas e efeitos especiais de última geração, que poderão ser apreciados em 3D.
Veja o trailer:


SETE DIAS COM MARILYN – No ano em que a morte de Marilyn Monroe completa cinco décadas, chega às telas (com atraso, porque o trailer já era exibido desde janeiro, mas antes da data em questão, que será apenas em agosto) esta produção que não é exatamente uma biografia, mas acompanha alguns dias da vida e da carreira da estrela. 



A história se passa nos anos 50, quando ela chega a Londres para gravar O príncipe encantado, mas acaba despertando paixões no jovem assistente de direção, Clark. Michelle Williams foi indicada ao Oscar de atriz por seu trabalho nesta fita, e parece ter encarnado Marilyn, tanto no gestual quanto na entonação de voz. A maquiagem, perfeita, também contribui para um bom resultado. Kenneth Branagh, interpretando Laurence Olivier, também foi indicado a Oscar, como coadjuvante.
Veja o trailer:


AS IDADES DO AMOR – Comédia romântica que tenta resgatar o prestígio que os italianos tinham no gênero nos anos 40 e 50. São várias histórias interligadas que, juntas, formam uma ciranda de romances dançada por casais de várias idades tendo a bela região da Toscana como pano de fundo. Em um cenário desses, é fácil se apaixonar. Um dos filmes mais decentes de que Robert De Niro participa em muitos anos. Monica Bellucci continua bonita, mas já evidencia os sinais do tempo. Para casais.

ISTO NÃO É UM FILME – Há dois anos, a prisão do diretor iraniano Jafar Panahi gerou protestos de toda a comunidade cinematográfica internacional. Panahi foi acusado de “exercer atividades contra a segurança nacional e propaganda contra o regime”.Atualmente ele cumpre prisão domiciliar de seis anos e está proibido de filmar pelos próximos 20. Driblando a proibição, ele escreveu e dirigiu este documentário bem curto, no qual registra um dia de sua nova rotina imposta pelo Estado. Estréia exclusiva no Cine Jóia, para festejar o primeiro ano de reabertura do espaço.

VALE DOS ESQUECIDOS – A estréia nacional da semana é este documentário sobre a briga pela posse de terras no Mato Grosso, tomando por base o caso da Fazenda Suiá-Missu, considerado o maior latifúndio brasileiro dos anos 70. A diretora Maria Raduan debuta em longas-metragens com uma produção que encontrou diversos obstáculos para sua realização (ela sofreu ameaças e hostilidades) e levou dois anos para, enfim, começar a ser rodada sem maiores incidentes.

SONHOS EM MOVIMENTO – Aproveitando o bom público que o documentário Pina vem arrebanhando na cidade (mais de 87 mil espectadores já pagaram ingresso para assisti-lo, o que é notável para uma produção estrangeira do gênero), a Imovision lança este que pode ser considerado um prólogo do outro. 


Quando Pina Bausch morreu, ela se preparava para encenar seu célebre espetáculo Konthakof. Mas, em vez de trabalhar com sua trupe habitual, ela preferiu recrutar jovens de 14 a 18 anos sem qualquer experiência na dança e que nunca haviam sequer subido em um palco. O filme é um registro desses preparativos. Serve como ótimo complemento ao filme de Win Wenders e para quem quiser conhecer mais ou simplesmente relembrar como era o universo de Pina Bausch.
Veja o trailer:



quarta-feira, 25 de abril de 2012

Esvaindo pelo ralo das boas intenções


Há duas semanas, por ocasião do lançamento do filme 12 horas, escrevi aqui no blog: “pode ser bom ou ruim”. Depois de ter conferido a fita no cinema, estou inclinado a concordar com a segunda opção. Mas há ressalvas.

Jill Parrish (Amanda Seyfried, linda, linda, linda, mesmo quando aparece descabelada e suja de terra) tem um trauma que a acompanha há um ano, quando foi seqüestrada no meio da noite e jogada em um buraco em um gigantesco parque de Portland, onde vive. Mas conseguiu escapar de seu seqüestrador quando este já se preparava para matá-la. Agora, o pesadelo está de volta quando sua irmã Molly é atacada pelo mesmo criminoso. Jill se desespera e procura a polícia, mas ninguém consegue levá-la a sério. Por dois motivos: nunca foram encontrados vestígios do seqüestro de que ela diz ter sido vítima (curioso que nunca usam esse termo, só “abdução”, “abduzida”, o que pode levar o espectador desinformado a imaginar que o algoz das meninas seja um extraterrestre!); e seu histórico psicológico conturbado, que a levou a ficar internada em uma clínica para doentes mentais, na base de remédios, até que a irmã se propôs cuidar dela. Revoltada com a inoperância das autoridades, Jill resolve agir por conta própria e empreende uma investigação particular para libertar Molly. E o tempo escorre pelos dedos: ela tem apenas 12 horas para conseguir isso, ou sua irmã será assassinada.


Em linhas gerais, é isso aí. A estréia do brasileiro Heitor Dhalia no cinema norte-americano poderia ter resultado em um filme tenso e minimamente absorvente. Ele mostra eficiência na condução dos atores, consegue boas tomadas das inúmeras perseguições que recheiam a trama, mas, como diretor contratado, não pode fazer muito mais que isso. Também foi muito prejudicado por um roteiro extremamente frágil, cheio de furos e estruturado unicamente em ações improváveis, pior ainda por ser de uma autora experiente e conhecida, Allison Burnett (Outono em Nova York, Sem vestígios). Mesmo correndo contra o tempo e tendo a polícia, que deveria auxiliá-la, em seu encalço (porque foi checar o que achava ser uma pista e acabou ameaçando um comerciante com uma arma), tudo acontece muito fácil para Jill. Todas as dicas vão aparecendo sem muita complicação, todos parecem bonzinhos e dispostos a ajudar – até um vizinho recluso se dispõe a passar uma informação que futuramente se mostrará valiosa. 


Para conseguir atingir seus objetivos, a garota inventa histórias, às vezes absurdas, e banca a louca, como na seqüência em que engana duas meninas prometendo arrumar-lhes ingressos para um show de Justin Bieber! Nenhuma situação é plenamente crível, nenhuma se sustenta por si só, tudo anda em linha reta. Parece que Jill age e é guiada de acordo com o bom humor do acaso e, com isso, vai chegando cada vez mais perto do homem que levou sua irmã. Essa falta de plausibilidade básica me lembrou Encurralados, com Pierce Brosnan, Maria Bello e Gerard Butler, outro filme em que os personagens seguem uma lógica imprevisível para que seus planos tenham êxito. A diferença é que naquele filme há uma coerência interna mínima que ajuda o roteiro a funcionar. Aqui fica a impressão de que está tudo jogado, “pronto”, só falta Jill chegar ao lugar marcado e prender o cara (e para mim ela tem olhos verdes, e não azuis, como é dito ao longo do filme todo).


Não fosse por Amanda Seyfried e pelo nome brasileiro na assinatura da direção, o filme não mereceria maior atenção do público. A julgar por este trabalho, Dhalia precisará de muito mais do que 12 horas para provar seu talento em Hollywood. De preferência, com um roteiro mais consistente. Para mim, o filme já tem uma marca especial, porque foi o primeiro que assisti em um shopping do Rio, no caso, o Cinemark Botafogo.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

A vingança não tem voz


Abel Ferrara é considerado o mais maldito dos diretores malditos, e isso quem diz são seus próprios pares. O Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) realizou uma retrospectiva de sua carreira, exibindo todos os seus filmes e mais alguns curtas. Uma ótima chance para conhecer ou rever a obra de um cineasta inquietante, que navega pelas águas da produção independente e não costuma fazer concessões em seu trabalho. É meio “ame-o ou deixe-o”. Um dos títulos que foram apresentados foi este Sedução e vingança, segundo filme do diretor, que eu já havia visto há seis anos, em uma sessão perdida na madrugada de algum canal aberto e pude rever agora na tela grande.

O título nacional inventado para Ms. 45 passa uma idéia errada do que é o filme. Não há sedução nenhuma na história, que é pesada, tem cenas desagradáveis e se passa quase inteiramente em ambientes sujos e mal-iluminados. A jovem Thana é muda, mas isso não a impediu de arrumar um emprego em uma prestigiosa confecção em Nova York, onde é muito querida pelas colegas e por seu chefe. Um dia, voltando do supermercado, carregada de compras, é agarrada por um desocupado e arrastada para uma viela, onde é estuprada (quem faz o papel do marginal é o próprio diretor). Mesmo traumatizada, encontra forças para chegar até em casa, no violento e perigoso bairro do Bronx. Enquanto tenta se refazer sentada na cama de seu quarto, eis que o apartamento é invadido e... Thana é estuprada pela segunda vez! Agora, porém, consegue reagir, mata seu atacante e guarda os pedaços de seu corpo na geladeira. Esta segunda violência abala psicologicamente a jovem, que muda de personalidade e passa a levar vida dupla, trabalhando normalmente durante o dia e saindo à noite para caçar e eliminar homens violentos que maltratam e vitimam mulheres, munida de um revólver MS .45 (título original do filme). Sua obsessão pela justiça, contudo, a levará a um desfecho trágico.



O roteiro aproveita o filão do justiceiro urbano, que estava então ainda em moda no começo dos anos 80, impulsionado pelo sucesso dos filmes da série Desejo de matar¸ estrelados por Charles Bronson. De fato, Thana assume sua porção de mulher vingativa em nome de uma causa “nobre” (o extermínio de estupradores, “limpando” com isso a sociedade) e sai fazendo o que considera justiça, ainda que por vias tortas, mediada por uma ética sempre questionável. Mas ninguém vai ver o filme preocupado com questões éticas. A transformação da jovem, de moça indefesa a matadora implacável, é consistente e ganha uma representação simbólica no visual de Thana. No começo, seus cabelos estão soltos, livres para a vida, conferindo-lhe uma aparência romântica e sonhadora; depois que se assume como justiceira, passa a prendê-los, adotando um visual mais sóbrio, como se estivesse mais fechada para o mundo, impondo mais respeito.





Muito da credibilidade do filme é garantida pela atuação sólida de sua protagonista, Zoe Lund, que aparece como Zoe Tamerlis nos créditos e fazia sua estréia em cinema com apenas 19 anos. Sem poder usar a voz para se expressar, é nos olhares e gestos de sua Thana que ela passa toda a sede de vingança da personagem, aliás levando ao extremo a característica dos justiceiros urbanos, de falarem pouco e serem mais eficientes em suas ações do que com as palavras. Ela voltou a trabalhar com Ferrara em 1992, em Vício frenético, apontado como a obra-prima do diretor, e do qual também escreveu o roteiro, assim como o da refilmagem de 2009 com Nicolas Cage repetindo o papel que foi de Harvey Keitel. Fora isso, não fez muita coisa, encerrando a carreira pouco depois, em 1997.

Com Sedução e vingança, Abel Ferrara conseguiu angariar bons elogios da crítica, o que não havia se observado em seu trabalho de estréia em longas-metragens, o terror hardcore O assassino da furadeira, um dos autênticos Midnight Movies dos anos 70, em que explicita o que seria a tônica de boa parte de sua carreira dali em diante. Isso serviu para que seu nome se tornasse mais conhecido e, por tabela, facilitasse sua vida de realizador; no entanto, Ferrara se manteve sempre fiel a sua estética e continuou filmando em esquema independente, dando preferência a histórias menos comerciais e enveredando quase sempre pelo exagero e pelo radical.

Há algumas obras de Ferrara disponíveis em DVD, inclusive O assassino da furadeira, lançado em uma ótima edição pela Aurora, e cujos extras trazem seus primeiros curtas, além de entrevistas e trechos do filme pornô que dirigiu entre um projeto e outro, 9 lives of a Wet Pussy, de 1976, assinado com pseudônimo e que evidentemente ficou de fora da mostra (que preconceito!). Continuamos à espera que alguma distribuidora se interesse e lance este Sedução e vingança, e também Vício frenético, já que ambos só existem em VHS.

  


sexta-feira, 20 de abril de 2012

Estréias da semana

EU RECEBERIA AS PIORES NOTÍCIAS DOS SEUS LINDOS LÁBIOS – Bacana ver o cinema nacional despejando um lançamento por semana nas telas do país, dos mais variados gêneros e estilos narrativos. Só falta agora o público prestigiá-lo de vez. Isso pode acontecer com este aqui, embora talvez por motivos tortos, e mesmo estando relegado quase inteiramente ao circuito alternativo. Comemorando 30 anos de parceria, a dupla Beto Brant e Renato Ciasca trabalhou com o maior orçamento que já tiveram à disposição – R$4 milhões – para a adaptação do romance homônimo de Marçal Aquino, cuja escrita é por si mesma bastante cinematográfica, com cortes rápidos e ritmo veloz. 


A ação é ambientada em Santarém e conta o triângulo amoroso estabelecido entre o fotógrafo Cauby (Gustavo Machado), a bela e inconstante Lavínia (Camila) e o marido desta, o pastor Ernani (Zécarlos Machado). Ovacionado quando de sua exibição no Festival do Rio do ano passado, o filme rendeu o Troféu Redentor de melhor atriz a Camila Pitanga, que aparece o tempo todo em trajes sensuais ou nua (razão pela qual o público talvez descubra o filme – eta povo que só pensa em sacanagem!). A exemplo de Rodrigo Santoro em Heleno, ela teve de emagrecer bastante para viver uma das fases de sua personagem. Admito que não gosto dos trabalhos anteriores de Brant, com exceção de O invasor, cuja proposta narrativa é mais sensorial do que racional. Opção respeitável, mas seria mais interessante se ele resolvesse combinar as duas formas de contar uma história.
Veja o trailer: 

A PERSEGUIÇÃO – Campeão de bilheteria nos EUA, este filme de suspense/ação traz Liam Neeson como integrante de um grupo de petroleiros cujo avião que os transporta de volta para casa sofre uma falha mecânica e acaba caindo numa floresta do Alasca. 


Além das condições climáticas adversas, há outro inimigo ainda mais perigoso: uma matilha de lobos que enxerga no grupo um jantar e tanto. Não tem jeito: o negócio é fugir dos bichos. O filme é o que o título sugere, uma longa perseguição. A mim não disse muito, mas certamente o filme encontrará seu público por aqui.
Veja o trailer:

AMERICAN PIE – O REENCONTRO – Sétima (sim, sétima!) continuação da idéia original concebida em 1999. É o Sexta-feira 13 das comédias adolescentes. Desta vez, já adultos, os amigos se reúnem para relembrar os bons tempos e passar as idiotices que fizeram ao longo dos anos a limpo. Mas é claro que vai rolar muito sexo e trapalhadas durante o evento. Alguém ainda tem paciência com a turma do American Pie? Só mesmo o baixo nível cultural do povo brasileiro para justificar o lançamento disso aqui nos cinemas: a distribuidora sabe que há um público fiel, então, bola pra frente. Enquanto tantos bons filmes saem direto em DVD, e outros nem chegam aqui (Tiranossauro até hoje nada), joças como esta ficam atulhando as salas exibidoras. Para a turma que adora fazer hora em shopping.

A VIDA EM UM DIA – Este é o famoso projeto arquitetado pelo inglês Kevin Macdonald há dois anos. Ele convidou internautas de todo o mundo a postarem imagens pessoais no Youtube no dia 24 de julho de 2010. O resultado serviria de registro de uma época para gerações futuras, além de formar um grande e original mosaico de ações humanas interligadas. Premiado com o Oscar de Documentário em 1999 por Um dia em setembro, Macdonald também tem no currículo obras respeitáveis, como O último rei da Escócia e Intrigas do estado. Ou seja, não é um amador tentando aparecer com alguma bobagem multimídia, como se espera de um filme desses. Mas não sei, sinceramente, onde estaria o interesse do público por ver isso aqui.
 
FLOR DA NEVE E O LEQUE SECRETO – Wayne Wang é um nome conhecido dos cinéfilos desde os anos 90, quando assinou a direção de filmes que se tornaram queridos do público, como Cortina de fumaça, Sem fôlego, O clube da felicidade e da sorte, entre vários outros. Nunca foi campeão de bilheteria, mas firmou seu lugar na seara independente, sempre dirigindo dramas humanistas ou comédias românticas.


Este seu novo projeto tem título de filme de artes marciais, mas é uma história familiar sobre duas mulheres que tentam compreender as origens de suas ancestrais laotong, uma milenar dinastia chinesa. Boa opção para os fãs de Wang e para quem gosta de cinema independente.
Veja o trailer:


 DIÁRIO DE UM JORNALISTA BÊBADO – Johnny Depp encarna o jornalista Paul Kemp, que se cansa da vida agitada em Nova Iorque e resolve ir para Porto Rico trabalhar em um tablóide local. Encharcado de rum em sua nova vida, Kemp logo descobrirá negócios obscuros que aquela republiqueta de bananas esconde sob o prisma de paraíso tropical. Assim, sua sonhada paz está longe de acontecer. Bom elenco: Richard Jenkins, Aaron Eckhart, Amber Heard. O filme já caiu na rede há bastante tempo.



quarta-feira, 18 de abril de 2012

Amor virtual pode dar certo - o e-book e eu

Um e-book apresenta inúmeras vantagens, mas ainda não consegue nos fazer sentir o cheiro da chuva

Ler um livro físico é uma experiência tão diferente de ler um e-book quanto assistir a um filme no cinema ou baixado da internet. Pode ser até a mesma história, mas perdem-se alguns elementos fundamentais para a perfeita apreciação do espetáculo. Tenho firmes e particulares motivos para crer que o livro físico não desaparecerá; no entanto, observada sua natural evolução, em pouco tempo estaremos deixando de carregar pilhas de volumes comprados em sebos ou livrarias e trazendo apenas um único dispositivo que nos permitirá carregar tantas obras quanto seria possível fazê-lo nesses “tempos antigos”. Como praticamente tudo relativo ao universo cibernético, um livro eletrônico se caracteriza pela frieza absoluta: a ele, falta o contato, o manuseio, o toque, o cheiro, o leve virar de páginas, a sensação de completude que há entre um leitor e seu livro. Um e-book é tão meu quanto qualquer livro físico de minha biblioteca, mas sente-se que há algo incompleto. Há um distanciamento, uma anônima indiferença, mesmo e por mais que sejam oferecidos recursos ao leitor, para que ele complemente, a seu modo, as informações contidas no livro, com a possibilidade de inserir marcações e comentários à margem (como fazemos com os volumes físicos). Para usar um termo recorrente entre os profissionais de informática, esta questão estaria linkada a outra de maior alcance.
Supondo que tais intervenções sejam possíveis nessa avalanche de novidades tecnológicas que inundam cotidianamente nossas possibilidades pessoais, ficaria a pergunta: isso seria literatura? Interferir na criação do outro, do citado artista (até que me provem o contrário, todo escritor é, para mim, um artista), moldá-la a nosso gosto? Ou não haveria mais literatura a ser consumida, e sim palimpsestos genéricos, que seriam produzidos tendo apenas uma base (o texto do autor) para ser devidamente desvirtuada, modificada? Isso seria literatura? Isso seria arte?
Analisando a assustadora viabilidade de tal ocorrência, seria mesmo possível entender que a literatura chegaria a um processo falimentar inquestionável. De certa forma, já estamos caminhando para isso – com tantos blogs e tantas novas plataformas surgindo a cada dia, tantas pessoas escrevendo sobre os mais variados assuntos, tantas idéias circulando, que o resultado óbvio é um imenso vazio opinativo. Contudo, a falência da literatura representaria simbolicamente não só o fim de todo o pensamento organizado e racional como o absorvemos ao longo dos séculos, mas também, por que não dizer, o fim do intelectual, não só da figura tradicional, de óculos, com conhecimento acima da média, idéias bem sedimentadas, sofisticação artística, mas também, e sobretudo, da intelectualidade como forma de pensamento, como capacidade de plena crítica pautada pelo bom-senso e pelo refinamento estético.
Fato é que os livros virtuais vêm alcançando lugares de destaque nos últimos tempos: grandes editoras optam por plataformas on-line para seus lançamentos, ao mesmo tempo em que tornam disponíveis, na rede, volumes inteiros para download. Como tudo no mundo, a leitura se modifica. Porém, há um aspecto que o e-book ainda não conseguiu substituir. Ler não é simplesmente puxar um livro da estante, abri-lo e dedicar algumas horas do dia a ele. Os mais apaixonados pelo livro sabem que, no fundo, o que há é um processo de enamoramento: primeiro, escolhemos o livro na prateleira; depois, flertamos com ele, indo e vindo, ameaçamos pegá-lo, trazê-lo a nós, mas desistimos da ideia no último minuto; depois, reforçamos a investida, por fim nos apossamos dele, lemos a quarta capa, a orelha, arriscamos até uma rápida olhada no índice (se houver) ou nas apresentações. Depois, nós o devolvemos ao lugar, deixamos que descanse, “esquecemos” dele, até que mais tarde, consumidos pela curiosidade, inebriados pela presença do livro ali, ao nosso alcance, o tomamos em mãos e iniciamos a lua de mel – a leitura, a fruição propriamente dita. Não deixa de ser uma espécie de relação sexual, entrega, paixão – o “orgasmo” ocorre quando chegamos ao clímax da história, ou quando, por algum motivo, somos irreversivelmente capturados pela força das palavras, pela engenhosidade da narrativa.
Se o livro físico vai mesmo acabar, como profetizam alguns especialistas no mercado, tenho cá minhas dúvidas. Sei que, se isso acontecer de fato, toda a experiência da leitura será modificada – e, ouso dizer, uma parte fundamental desse processo estará extinto. Não mais haverá a ligação necessária entre o leitor e seu objeto, mas entre o humano e a máquina, transmudando sensações, relativizando prazeres – talvez seja mesmo o começo de uma era, mas, irreversivelmente, o final de um tempo. 

(Artigo publicado na revista Caderno Zero, em setembro de 2011)

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Isto é punk rock, bebê!

Imagino que meu comentário vá soar envelhecido e bastante atrasado, pois imagino que muitos dos eventuais leitores já conheciam a figura da qual irei me ocupar. Talvez eu passe atestado de ingenuidade, mas, como parto de um filme para externar minhas impressões, achei que caberia neste blog, mesmo que possa não constituir novidade de maneira geral.

Nunca tinha ouvido falar em GG Allin até me deparar com esse documentário Hated – GG Allin e os Viciados Assassinos, realizado por Todd Phillips em 1994, quase 30 anos antes de ele se tornar famoso pela comédia Se beber, não case e suas duas continuações (sim, há uma terceira parte a caminho!). Embora tenha se especializado em fitas cômicas – tem ainda no currículo Starsky e Hutch, Um parto de viagem e Escola de idiotas, entre outras – , o que se vê aqui está muito mais para um filme de horror.


Em apenas 50 minutos, o diretor consegue traduzir toda a personalidade de seu excêntrico biografado. Por muito tempo, pensava que Crumb fosse o documentário mais honesto já realizado sobre uma figura controvertida, no caso, o cartunista Robert Crumb, “pai” do Gato Fritz e de outros personagens igualmente desajustados, porque nem ele nem seus familiares se negavam a prestar declarações polêmicas e nem um pouco enaltecedoras a seu respeito. Mas Crumb era um santo perto de Allin. Provavelmente nem em seus delírios mais esquizofrênicos chegaria perto de criar uma realidade tão impactante quanto a que vemos aqui. O que reforça ainda mais o aspecto chocante é que Allin em momento nenhum tenta se defender ou ao menos justificar seus atos. Ele assume o que é e o que faz e pronto. Uma atitude bem hardcore, sem dúvida, bem de acordo com o gênero musical que lhe deu fama, o punk rock, ou, como bem define o irmão do enfocado na última fala do filme, punk suicida.

E ele está certo, a postura de GG no palco e, por extensão, na vida, foi a de um suicida, alguém que não se importava com nada, vivia como achava que devia viver, fazia o que queria (ele mesmo diz isso em outro trecho) e, por isso, despertava a inveja e a raiva das autoridades, simplesmente porque desafiava as convenções estabelecidas. Seria uma postura elogiável se não fosse tão autodestrutiva. O que se vê no documentário são cenas escabrosas, ainda mais assustadoras por não se tratar de ficção: parece inacreditável, mas tudo o que vemos é real.

O filme não enrola e já começa mostrando uma performance de GG Allin em um show, cantando pelado (só se apresentava assim), esmurrando a cabeça repetidas vezes com o microfone – e depois vemos seu rosto ensangüentado e cheio de hematomas – , provocando os espectadores, o que leva à uma briga com o público. A imagem mais nauseante, contudo, mostra Allin enfiando uma banana no ânus de outra pessoa, não dá para saber se homem ou mulher, e ingerindo a fruta em seguida. E é por aí que caminha o filme. Quem não quiser ver cenas similares deve desistir neste momento. Os resistentes, contudo, não irão apenas se espantar com o que vem a seguir; também irão assistir a um dos documentários mais reveladores e impressionantes em termos de construção da figura de seu biografado.


Merle Allin, irmão de GG, uma figura muito esquisita, sempre de óculos escuros pequenos e redondos, calvo, com um discutível bigodinho à Hitler e barba apenas nas laterais do rosto, é quem concede a maior parte das entrevistas, mas revela pouco de sua vida familiar. No máximo, ficamos sabendo que GG gostava de usar roupas femininas no colégio e por isso era perseguido pelos colegas. Tive de ir ao Wikipédia pesquisar mais informações sobre ele e fiquei sabendo que seu nome de batismo era Jesus Christ Allin, conseqüência de uma família ultrarreligiosa de Lancaster, no estado de New Hampshire, onde nasceu em 1956, mas a mãe mudou seu nome para Kevin Michael pouco antes de o garoto entrar para a escola. Vem daí, certamente, o fato de GG dizer repetidas vezes que “era Jesus, Jesus sou eu” em entrevistas gravadas e apresentadas ao longo do filme. Considerando o poder de influência que exercia sobre seus enlouquecidos fãs, pode-se dizer que Allin não estava de todo errado. Mesmo apresentando um comportamento facilmente definível como psicopatia social, ainda assim angariava simpatia por parte de seus seguidores, que apreciavam suas apresentações, para eles, um misto de música e encenação teatral. Um dos depoimentos contidos no filme é o de um rapaz que chega a afirmar que, se Allin se matasse no palco, ele se mataria logo em seguida.

O que importa mesmo são as imagens, cada uma mais crua e chocante que a outra. Não que seja um exercício de sadomasoquismo visual ou exploração da miséria alheia: a opção do diretor foi traduzir em imagens a alma de um, vá lá, artista, mesmo que perturbado, socialmente doente. E é nesse ponto que o documentário se inclui como um dos mais poderosos já feitos. Phillips acompanha a última turnê da banda de GG, os Viciados Assassinos, por diversas cidades, e com isso ganha a chance de flagrar momentos que causam nojo e repulsa. Há dois mais impactantes. Um que mostra uma espécie de palestra na New York University (NYU), em que Allin fala a uma platéia de estudantes, sempre pelado. Primeiro, introduz uma banana no próprio ânus, esfrega e atira os pedaços sobre a assistência, que ri, estarrecida e incrédula. Depois, diz que vai dar um show mas que, para isso, todos deviam tirar a roupa. Os estudantes começam a se retirar, apavorados, enquanto Allin investe contra eles, aparentemente nervoso porque não o levam a sério. Então, passa a arremessar as carteiras na direção dos fugitivos, sendo contido por seguranças. 


Outro momento ainda mais nauseante se passa no dia do aniversário dele, quando recebeu o “presente” arranjado por um fã. GG está deitado no chão, com a boca aberta, sorvendo os jatos de urina que lhe são vertidos por uma mulher; em dado momento, Allin se engasga com a urina e vomita no próprio rosto. Mais deprimente que isso, só a declaração do jovem fã, que conta o fato entre risadinhas e em tom de êxtase, sentindo-se honrado por ter conseguido dar aquele presente a seu ídolo. “Aquilo foi demais!”, diz ele.

Há ainda outro momento em que Allin defeca no palco na frente do público; em seguida, se deita no chão e come as próprias fezes, espalhando o que restou no corpo cortado por cacos de vidro e no rosto ferido pelas microfonadas, enquanto vocifera versos de uma candura exemplar: “Foda-se, seu verme! / Tudo o que tenho é sangue pra você! / Um dia seu fim estará próximo / e eu estarei rindo do seu medo” (este vídeo está disponível no Youtube, mas optei por não inseri-lo aqui, quem tiver interesse e estômago fique à vontade para procurar, mas não diga que não foi avisado). Há letras mais edificantes: “Eu quero matar meus pais e meu irmão. / Quero matar o presidente e os negros também. / Quero matar todo mundo. / Meu temperamento está piorando, tome uma atitude.”

É claro que ninguém é obrigado a aceitar o estilo de vida que GG Allin escolheu para si. É perfeitamente natural que a sociedade estabelecida e com uma mente razoavelmente saudável repudie seu comportamento e prefira fazer de conta que ele não exista. Mas os excessos de Allin servem também para denunciar uma certa hipocrisia que não temos como disfarçar. Ele joga na nossa cara a seguinte verdade: se isso incomoda alguns, é porque vocês não têm coragem de viver intensamente e se mantêm acorrentados aos dogmas escravizantes de uma vidinha medíocre. De certa forma, Allin representa todas as minorias que estão aí, convivendo conosco diariamente, e que fingimos serem invisíveis. 


Como diz precisamente o diretor, em off, quase no fim do filme, para justificar sua simpatia por GG e sua banda: “Eu não sei se ele nasceu assim ou se a sociedade o criou, mas sei que os Viciados Assassinos e seus fãs são demais. Eles representam uma parte da América na qual a maioria das pessoas prefere não pensar.” Afinal, é mais fácil rejeitarmos sua existência do que tentarmos entendê-las como seres humanos como nós, apenas com distinções e características específicas. Se as atitudes e a própria vida de Allin era punk, foi porque ele acreditava que assim estaria representando radical e adequadamente o estilo, que é, na sua essência, um ritmo de protesto contra tudo “o que está aí”, como pregavam seus primeiros representantes.

No dia 27 de junho de 1993, os Viciados Assassinos fizeram sua apresentação mais violenta em Nova York, onde os fãs saíram quebrando tudo após o show. Na saída, a banda foi toda a uma festa na qual GG Allin se excedeu no álcool e nas drogas e então sua missão chegou ao fim. Tinha apenas 36 anos. Uma morte mais que anunciada. Seu velório foi um circo, com fãs tirando fotos de seu corpo nu dentro do caixão, tendo nas mãos inertes uma garrafa de uísque.

Descobri que, apesar de tudo, ele tinha um enorme fã-clube e conseguiu ser bastante popular do seu jeito torto, tinha até boneco! Não acompanho a cena musical, mas imagino que nunca mais houve ou haverá alguém que adote a mesma postura radical de GG Allin. 

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Estréias da semana

ÁREA Q – Pouca gente já deve ter ouvido falar em Gérson Sanginitto. Pudera: ele fez toda sua carreira nos Estados Unidos como produtor, roteirista e montador. Esta é praticamente sua estréia em longa-metragem, já que em seu trabalho anterior, Cadáveres 2, disponível em DVD, assinou como codiretor. Assim, o que poderia soar ridículo – um filme brasileiro de ficção científica – acaba ganhando certa dose de respeito e credibilidade. A produção é estrelada por Murilo Rosa, Tânia Khalil e o norte-americano Isaiah Washington, da franquia Garotas selvagens e da série Grey’s anatomy


A trama acompanha as investigações empreendidas por um grupo de cientistas a respeito da misteriosa aparição de ETs no interior do Ceará. Por que não em Varginha, que já tem experiência no assunto? Também no elenco Ricardo Conti, que estrelou episódios das séries Cilada e Separação?.
Veja o trailer:

AS NEVES DO KILIMANJARO – Não se trata de uma refilmagem do filme homônimo de 1952 estrelado por Ava Gardner e Gregory Peck, mas sim uma discussão a respeito de nossas posições sociopolíticas simbolizadas pelo drama de um casal em férias. Os bem-sucedidos Michel e Marie-Claire passam uma temporada na Tanzânia (daí a referência geográfica do título) quando um assalto mexe com as convicções que ambos julgavam sedimentadas pela experiência do tempo. O aclamado diretor Robert Guédiguian (Entre os muros da escola, Palma de Ouro em Cannes) provoca o espectador abrindo espaço para vários pontos de vista sobre uma mesma questão. Ótima opção para quem busca algo mais na sala escura do que apenas diversão leve e passageira. Rende bons papos depois da sessão.
Veja o trailer: 

12 HORAS – Mais um diretor brasileiro se arrisca em Hollywood. Agora é Heitor Dhalia, que fez Nina e À deriva e nos legou a obra-prima O cheiro do ralo. Nessa trama de vingança, uma jovem que escapou de um psicopata há dois anos desconfia que o mesmo homem possa ter seqüestrado sua irmã mais nova. Como ninguém acredita em sua história, o jeito é partir pra briga e resolver ela mesma o caso. 


Pode ser bom ou ruim, mas os imensos olhos verdes de Amanda Seyfried são motivo suficiente para se pagar ingresso e prestigiar a estréia de Dhalia, tentando confirmar o talento que já demonstrou em terras tupiniquins.
Veja o trailer: 

CAIRO 678 – Produção egípcia que acompanha a vida de três mulheres de realidades bastante distintas, mas com um ponto em comum: a intolerância sexual de que são vítimas. Elas se unem e iniciam uma série de ataques contra os homens que as oprimem. Baseado em fatos reais, mostra a difícil condição feminina naquele país, e, por extensão, em boa parte do mundo árabe. Foi exibido no último Festival do Rio. Recomendado.

O PRÍNCIPE DO DESERTO – A nova futura meca do cinema mundial fica no Qatar e a indústria local já está sendo chamada de “Óleowood”, em alusão a seus poços de petróleo. Uma das produções mais caras daquele país, esta espécie de versão local de Lawrence da Arábia narra a rivalidade entre pai e filho pelo controle político da região, nos anos 30. Antonio Banderas comparece para dar o molho de interesse global num filme que, sem isso, provavelmente, passaria batido nas telas do mundo. Opção pipoca da semana.

À MARGEM DO LIXO – Às vésperas do fechamento do lixão de Gramacho, chega ao circuito esse documentário dirigido por Evaldo Mocarzel sobre a necessidade da reciclagem e que, por tabela, discute a importância daquele local para a estrutura socioambiental da cidade e do país. Serve como complemento ao ótimo Lixo extraordinário

COMO AGARRAR MEU EX-NAMORADO – Mais uma comédia romântica estrelada por Katherine Heigl. Aqui ela interpreta uma caçadora de recompensas cuja primeira missão é capturar um policial aposentado. Logo ela descobre que o sujeito foi seu namorado nos tempos de colegial, quando a seduziu e a abandonou. Veja como o mundo é pequeno! Dá para imaginar o que acontece depois. O cartaz é bem sugestivo; o filme não deve ser tanto assim. Para fãs do gênero e da atriz.


A TODA PROVA – Antecipada em uma semana a estréia deste novo filme de Steven Soderbergh, cuja crítica completa está na postagem de terça-feira, dia 10, veja no menu ao lado.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Não me condenes antes que me explique

Algumas pessoas me escreveram nos últimos dias perguntando sobre certos aspectos do blog. Como são questões pertinentes a quem tem a boa vontade de ler este espaço, resolvi respondê-las em aberto e aproveitar para esclarecer os pontos abordados de maneira definitiva.

Por que seu blog não tem fotos nem vídeos? (Vítor)

Admito minha ignorância. Eu estava usando o editor de textos antigo, que não permite muita mobilidade de recursos. Por exemplo, não era possível espalhar fotos intercaladas com o texto, elas tinham de ficar fixas em um canto, de preferência logo depois do título; o carregamento de vídeos era tediosamente lento. Agora que passei a usar outro editor, creio que esses problemas já foram resolvidos, mas...

Por que você excluiu as fotos e o trailer do filme A toda prova? De manhã eles estavam lá e à noite não estavam mais. (Álvaro)

... de vez em quando alguma coisa ainda sai errada. Fui alterar uma vírgula do texto que já estava pronto e publicado e ele saiu do formato, ficou cheio daqueles caracteres, ou seja, estava imprestável. Não sei o que acontece, talvez eu seja muito ignorante no manejo dessas ferramentas, mas o fato é que não consigo ajustar esses pequenos inconvenientes. Como o texto ficou impossível de ler, tive de excluí-lo e repostá-lo sem as fotos que estavam carregando com erro. Achei melhor excluir o vídeo também. Mas como o foco do meu blog nunca foi nas imagens e sim no texto, não considero uma falha deixá-las de fora. Vou seguir tentando, vai que um dia eu aprendo de tanto errar.

Você mantém a grafia antiga de palavras como “idéia”, “estréia”, “seqüência” etc. Não sabe que o Acordo Ortográfico está em vigor e essas palavras tiveram a grafia modificada? Por que insiste em usá-las? (Carmem)

Agora tem sempre uma Carmem na minha vida para dizer que o que faço é cheio de erros (piada interna). Evidentemente sei que a grafia dessas e de outras palavras mudou, e como revisor profissional que sou, sigo o Acordo, eliminando acentos indevidos, tremas etc. Porém, se mantenho a forma antiga de escrever, é por posicionamento, posso até dizer, político. Esse Acordo foi imposto pelo governo; não houve debate acerca de sua utilidade ou validade, não foram chamados gramáticos, professores ou profissionais da área lingüística para opinarem, nem a parcela pensante da população teve direito de se manifestar. O governo decidiu e pronto, num arroubo totalitário. Sou obrigado a usar o Acordo nos trabalhos que realizo, mas aqui, no meu espaço, em que governo nenhum se intromete, mantenho a grafia antiga, ou “errada”, como preferem alguns. Como ninguém vai me contratar baseado no que escrevo, muito menos usar este espaço como etapa eliminatória de qualquer coisa, não vejo mal algum em manter minha posição.

Você acha errado comprar DVDs piratas na esquina, mas faz apologia de downloads de filmes pela internet. Não é favorecer a pirataria do mesmo jeito? (Laura)

Não exatamente. Em primeiro lugar, não faço “apologia” de nada, apenas comento que tal filme está disponível na rede, sem nem citar em que site ele se encontra armazenado. Quem quiser ou tiver interesse, fique à vontade para decidir, faz uma busca. Baixa quem quer. Não tocar nesse assunto e achar que isso vai resolver o problema é passar atestado de ingenuidade. Como o marido traído queimar o sofá ou tirá-lo da sala. Outro ponto interessante. Como sou balizado por minha lógica própria, estabeleci uma distinção entre o que seria certo e errado nessa questão. Para mim, só se configura pirataria quando se obtém alguma vantagem financeira com isso. Assim, o cara que vende DVDs piratas na esquina adota uma postura ilegal, e também quem compra. Se eu fizer um download e assistir ao filme sozinho e depois apagá-lo ou até copiá-lo para ter em minha prateleira, não estou obtendo vantagem alguma. O erro está no comércio, na obtenção de lucro ilegal. Porque impede o ganho dos direitos autorais por parte de técnicos, distribuidores credenciados etc. Ou seja, é, de certa forma, roubar dinheiro dos profissionais envolvidos no processo audiovisual. Eu posso ver um filme baixado pela internet e até comprar o DVD original depois, já que, como colecionador, é o que sempre vou preferir mesmo.
Além disso, considere outro aspecto. Quantos filmes a gente encontra disponíveis para download que nunca foram e dificilmente serão lançados no país? Já escrevi sobre Meet the Feebles, um filme engraçadíssimo que nunca deu as caras por aqui, mesmo depois do sucesso mundial alcançado pelo diretor Peter Jackson. O que fazer? Deixar de conhecer a obra? Ignorar que ela existe? Conformar-se com um “Ah, se não existisse internet eu não ia ver mesmo”? Penso que num país como o Brasil, em que as opções de cultura e entretenimento são muitas vezes reduzidas, sobretudo em cidades menores, não se deveria criar tanto problema com isso. A maioria das cidades não tem cinemas; como as pessoas vão ampliar seus horizontes culturais? Vendo novela? Assistindo ao BBB? Assim, a única alternativa é mesmo fazer o download de filmes pela internet. Entendo isso como uma forma de difusão cultural.

A questão é polêmica e voltarei a ela em outra oportunidade.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Boa de briga

Não consigo entender a lógica de trabalho desse Steven Soderbergh. Ele deve ter atingido um patamar tal na carreira em que não precisa mais se preocupar com dinheiro e pode se dar ao luxo de fazer filmes por diversão, sem compromisso com nada, o que talvez explique porque alterna tanto entre filmes mais sérios e autorais (Traffic, Contágio), outros que mais parecem brincadeira comercial entre amigos (a série dos homens e segredos, o intragável Full frontal, O desinformante) e projetos quase experimentais (Bubble, Confissões de uma garota de programa). A este último pertence seu novo filme, A toda prova, que foi exibido em Berlim e tem data de estréia marcada para o dia 20 de abril (mas pode mudar). Só mesmo a assinatura do diretor para justificar seu lançamento nos cinemas do país, ainda que provavelmente fique restrito às salas alternativas. Fosse outro pobre coitado e iria diretamente para o mercado de homevídeo.

A história começa in media res, numa lanchonete de beira de estrada, onde está Mallory Kane. No local, ela terá um encontro inesperado com um homem que não esperava ver. Eles discutem, ela dá uma rasteira e deixa o sujeito desacordado e foge pegando um zé-mané como refém. Enquanto dirige o carro dele, vai contando a sua história e explicando como chegou até ali. A maior parte do filme é, portanto, um grande flashback, onde então ficamos sabendo que ela é agente de um órgão secreto do governo e que foi traída pelos seus companheiros após libertar um chinês do cativeiro em uma missão em Barcelona. Todos tentam matá-la, mas, graças a suas habilidades físicas e de luta, ela vai escapando, de armadilha em armadilha, sempre na base do sopapo e das pernadas. E é assim que a valente Mallory aniquila um a um de seus perseguidores, até um encontro decisivo com seu ex-chefe, e a vingança final, em cena que não vemos, mas podemos imaginar o que acontece.

A exemplo do que já havia feito outras duas vezes, Soderbergh volta a creditar o papel principal a uma atriz sem experiência no meio cinematográfico profissional. Em Bubble, experimentou com Debbie Doebbereiner (que nunca mais fez nada, não era mesmo atriz) e mais recentemente escalou a musa do cinema pornô Sacha Grey como estrela em Confissões de uma garota de programa, em escolha que deu o que falar. A bola da vez é Gina Carano, campeã norte-americana de MMA (sim, existe uma versão feminina daquilo! – onde esse pobre mundo vai parar?). Vendo o filme, dá para entender o motivo de uma lutadora ter sido escalada para o papel. Não sei se alguma outra atriz de gabarito, mesmo com um mínimo de treino e preparação, agüentaria o tranco nas cenas de luta, que são razoavelmente violentas – leva soco na cara e tudo – mas também divertidas. Nunca esquecendo que são sempre combates entre ela e algum homem, ou seja, fazia-se necessário uma atriz que passasse credibilidade, se mantivesse em igualdade de condições. Neste sentido, Gina convence inteiramente, não precisa se esforçar muito, ela dá o recado e pronto. E ainda apresenta algumas qualidades interpretativas – embora seja sempre meio complicado avaliar a atuação de astros de fitas de ação porque não precisam fazer muito, uma pernada aqui, uma cotovelada ali, uma joelhada acolá, não sei como podemos medir o talento de um intérprete nesses casos. Mas, no que lhe é proposto, Gina se sai bem, favorecida pela maquiagem que a deixa realmente atraente em algumas cenas. Se um dia quiser abandonar o octógono e se arriscar na frente das câmeras, pode ter futuro, desde que não precise decorar muitas falas nem seja escalada fora de posição, ou seja, não a deixem fazer comédia, drama, nada que exija esforço.

Não são comuns mulheres protagonistas de filmes de ação em que saem dando bordoada no elenco masculino. De cabeça, só me lembro de Cynthia Rothrock, uma loirinha corpulenta que chegou a fazer relativo sucesso no começo dos anos 90, apontada como um “Dolph Lundgren de saias”! Ainda trabalha no seu estilo, mas perdeu o interesse. Mesmo porque, a exemplo dos astros masculinos do gênero, a idade chegou também para ela e ficou difícil convencer nas cenas de pancadaria.

O roteiro do filme é primário, não há qualquer novidade na forma como o tema é tratado. Mas Soderbergh é um artesão das imagens e consegue ótimos ângulos nas cenas de luta e perseguição. O encontro entre Gina e Ewan McGregor numa praia deserta é mostrado como se fosse um recurso multi-ângulo de algum DVD, com cortes rápidos e uma montagem que aumenta a adrenalina do embate, também favorecido por uma boa fotografia. Também ajudam as locações autênticas em Barcelona e Dublin, conferindo maior veracidade à narrativa. Como tem muito prestígio na indústria, Soderbergh conseguiu reunir astros de peso para gravitar em torno de Gina Carano, alguns em papéis pequenos. Assim, o elenco traz, além do citado McGregor, Michael Douglas, Antonio Banderas, Michael Fassbender (de novo!), Bill Paxton, o sumido francês Matthieu Kassowitz. Ou seja, coadjuvantes de luxo para mais uma brincadeira descompromissada, sendo que especialmente Banderas, de barba grisalha e ar cansado, parece estar se divertindo bastante.

No fundo, é uma fitinha banal de vingança, dessas que os americanos produzem às pencas e que servem para atulhar as prateleiras das locadoras, o tipo de filme que faz a alegria do espectador macho e pouco avesso ao uso dos neurônios. Não sei se justifica pagar ingresso. Mas comprova que Soderbergh, mesmo quando brinca de fazer cinema, ainda pode ser melhor do que a média atual.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Por um lugar no mundo

A chamada “maldição do Oscar” é um fato. Depois de ganharem o prêmio, alguns atores / atrizes, em vez de verem suas carreiras deslanchar, acabam embarcando em uma frota de canoas furadas e vão parar no fundo do poço. Aconteceu com Mira Sorvino (nunca mais fez nada relevante) e Cuba Gooding Jr. – este, coitado, se enterrou de vez por conta de vários projetos equivocados. Alguns dão seqüência à carreira, mas só conseguem papéis ridículos, ainda que façam filmes decentes. Só um ator de verdade seria capaz de encarnar um tipo esquisito e manter a dignidade intacta. Este ator é Sean Penn. Este personagem é Cheyenne. O filme é Aqui é o meu lugar, estréia em terras norte-americanas do diretor italiano Paolo Sorrentino, logo após ter feito sucesso com a tensa comédia política O divo.



Fosse outro ator e o personagem cairia facilmente na caricatura, no grotesco e no completo ridículo. Penn imprime humanidade e um contido sofrimento a um tipo quase almodovariano, que causa estranheza por sua simples caracterização. Com quase 50 anos, Cheyenne é um ex-astro do rock que vive dos direitos autorais de suas músicas. Não trabalha, não tem filhos e mantém um casamento asséptico com sua esposa frígida (Frances McDormand). Mesmo que seu tempo já tenha passado, ele insiste em se vestir como se ainda estivesse no auge da carreira, com visual gótico, roupas escuras, coturno, unhas pintadas de preto e uma peruca doida que realça seu aspecto sorumbático. De poucas palavras, parece viver isolado em seu mundo de desilusões. Um dia, recebe a notícia de que seu pai, com quem não tem contato há 30 anos, está à beira da morte. Cheyenne sai de sua fortaleza de cristal para revê-lo, mas chega tarde e o encontra já morto. Porém, resolve concretizar o desejo final do pai: encontrar um antigo criminoso nazista que o humilhou em Auschwitz e vingar-se. Não há alternativa. Tem início uma longa e dolorida busca ao algoz, mas não apenas isso: é a grande oportunidade de Cheyenne espantar fantasmas do seu passado. A cada cidade que vai parando pelo caminho, vai descobrindo um pouco daquele homem que não chegou a conhecer – saiu de casa aos 13 anos porque o pai não gostava que ele usasse maquiagem e desaprovava seu modo de vestir e de ser.

Talvez seja difícil para o espectador simpatizar com Cheyenne porque ele é uma figura muito estranha. Um bafejo de uma vida que ficou no passado, à qual se agarra para continuar vivendo uma existência vazia, sem propósito, como se tivesse se fechado para qualquer tipo de vida exterior, de mudança. Fala baixo, quando fala, não se interessa por mulheres, não expressa emoções, mantém o olhar parado, perdido em algum ponto que só ele enxerga, parecendo agir mais por automatismo que outra coisa. É um fantasma, ele próprio, vagando pelo mundo sem um sentido concreto. É um ser em desordem. No entanto, há uma motivação forte para seu comportamento, uma ferida aberta, que somente poderá ser cicatrizada não pela ação do tempo, mas por um exercício de autoconhecimento. Quando Cheyenne sai em busca do algoz de seu pai, ele busca mais do que isso: busca uma identidade, um reencontro consigo mesmo, a reconstrução de sua história. Busca a redenção.

É um grande trabalho de interpretação, uma caracterização memorável, a qual Penn enriquece com alguns tiques, como soprar a mecha de cabelos que lhe cai diante dos olhos de vez em quando. Também tem ótimas tiradas, como quando explica por que não quis ter filhos: “O risco de um roqueiro ter filhos é que, se for uma menina, ela pode se tornar estilista de gosto duvidoso” (uma óbvia provocação a Stella McCartney, filha de Paul). Ele, que já ganhou dois Oscars, merecia ter sido lembrado pela Academia, assim como o filme, que acabou esnobado em um dos anos mais fracos do cinema norte-americano.

O roteiro deste road-movie existencial equilibra doses equânimes de drama e comédia, abrindo espaço para outros personagens igualmente interessantes – um caçador de nazistas, a garçonete que tem um filho gordinho com veleidades musicais, a fã gótica que sabe tudo sobre a carreira de Cheyenne. Na ótima trilha sonora, o destaque é para a canção-tema “This must be the place”, dos Talking Heads, executada várias vezes ao longo do filme, em diversos tons.

A mim, o filme foi conquistando aos poucos, depois que deixei a estranheza por Cheyenne de lado e me deixei levar pela poesia depressiva de suas imagens e de sua proposta. No começo, achava que era só uma comedinha com pinta de independente meio boboca; no final, me deu vontade de aplaudir de pé. É um filme de forte potencial cult, para ser descoberto, mas, para isso, é preciso esperar que seja lançado por aqui, mesmo que em DVD – só foi exibido no Festival do Rio, onde foi um dos títulos mais disputados.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Estréias da semana

XINGU - Mais uma aguardada produção nacional chega às telas nesta sexta-feira. Inteiramente filmada em locações, a história conta a saga dos irmãos Villas Bôas, Orlando (Felipe Camargo), Cláudio (João Miguel) e Leonardo (Caio Blat) , que, nos anos 40, se embrenham pelo Brasil Central desbravando as terras indígenas tomando contato com outro mundo, primeiramente colonizando, e, depois, tomando partido dos índios na luta por direitos e justiça. O sacrifício dos irmãos não foi em vão: a expedição resultou na criação do Parque Nacional do Xingu em 1961. O roteiro foi baseado no diário escrito pelos irmãos durante o processo, A marcha para o oeste, que, como manda a lógica do mercado, já foi reeditado pela Companhia das Letras usando o poster do filme como capa. Depois de realizar o belo e sensível O ano em que meus pais saíram de férias (2006), Cao Hamburger retorna à direção de longas com uma história que merece ser conhecida em seus detalhes, principalmente pelas novas gerações, que andam sem muitos referenciais em que se espelhar. Veja o trailer aqui: http://www.youtube.com/watch?v=OQwTWLwKLIM

ESPELHO, ESPELHO MEU - Mais uma versão da clássica fábula infantil da Branca de Neve. Ela agora é uma adolescente que ao completar 18 anos resolve sair do seu mundo encastelado e conhecer o reino em que vive. Revoltada com o que vê, volta para derrubar a rainha. Lily Collins, que vem se tornando umas das estrelas jovens mais promissoras de Hollywood (O mundo imaginário do Dr. Parnassus, Padre, Sem saída com o loboiola Taylor Lautner) dá vida à nova princesa nem um pouco passiva e que não se preocupa muito com a chegada do Príncipe Encantado (sinal dos tempos), enquanto Julia Roberts assume a idade fazendo um papel de quase uma bruxa má. Quem poderia imaginar que Julia faria um papel desses algum dia! Dirigido pelo indiano Tarsem Singh, cujos filmes podem até ser fracotes mas possuem uma concepção visual sempre interessante (lembram-se de A cela, com Jennifer Lopez?). Sean Bean faz uma participação especial e, pra variar, morre logo no começo.

JOVENS ADULTOS - Com Charlize Theron e Patrick Wilson. Escritora divorciada volta para sua cidade natal e resolve reconquistar o antigo namorado, mesmo sabendo que ele está casado e com filho. Pra piorar, a dona age como uma adolescente, tentando recuperar o tempo perdido. Prova que alguns escritores têm dificuldade para crescer. Por que não arruma coisa melhor pra fazer? Administrar um blog, por exemplo. Quem também não tem mais o que fazer é o espectador deste filme, já que tem coisa bem melhor passando.

A VIDA DOS PEIXES - O chileno Matías Bize, de quem já conhecemos Na cama e O bom de chorar, volta com mais uma história construída em torno de relacionamentos afetivos malsucedidos. De novo trabalha com sua atriz preferida, a linda Blanca Lewin, estrela de seus trabalhos anteriores e que também esteve na série Prófugos. Boa opção, que merece uma conferida. Outro filme que acabou sendo vítima da pirataria da internet: demorou tanto a ser lançado por aqui que já está disponível para download há muito tempo.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

E Lobato se revira no túmulo

Pesquisa encomendada pelo Instituto Pró-Livro e publicada semana passada revela aquilo que todo mundo desconfia: o brasileiro lê pouco. Muito pouco. Em média, apenas quatro livros por ano. Pior: só metade deles é lido até o fim.

Embora a pesquisa não represente muita coisa em termos estatísticos – foram ouvidas cinco mil pessoas em apenas 315 municípios – é emblemática da triste realidade cultural do nosso país. Brasileiro parece cultivar certa ojeriza quando o assunto é o trinômio arte-cultura-educação, para mim o alicerce que precisa estar mais firme na construção de qualquer nação que se proponha a ser realmente soberana e respeitável aos olhos do mundo. Não vou comentar outros aspectos que atestam a falência intelectual do Brasil, primeiro por não ser este o assunto em pauta e segundo porque são do conhecimento geral. Ficarei apenas no quesito livro e seus conexos, leitura e literatura. Ao mesmo tempo em que confirma a velha tese de que brasileiro não gosta de ler, o resultado da pesquisa lança ainda um mistério: como pode determinada obra ter 20 mil, 30 mil exemplares vendidos se o povo não gosta de ler? Onde vão parar esses livros? Enfeite de mesa? Peso de papéis? Ou simplesmente apodrecem nas prateleiras das residências, cumprindo sua função de estofo cultural para impressionar as visitas?

O resultado da pesquisa deste ano mostra uma involução no relacionamento do brasileiro com o produto livro em comparação com o ano de 2007, quando foi realizada pela primeira vez. Naquela ocasião, 55% da população era considerada leitora – para isso, deve-se ter lido ao menos um livro nos três meses anteriores à pesquisa. Desta vez, chegou-se à metade perfeita, ou seja, 50% admitiu ter lido no mínimo um livro nos 90 dias antecedentes. Outros fatos puderam ser confirmados. As mulheres lêem mais que os homens – são 57% delas contra 43% deles, uma diferença que pode não parecer, mas chega a ser quase abissal em termos percentuais. É mais uma bola nas costas que nós, machos, levamos. Ficamos preocupados com futebol, cerveja e pelada nos finais de semana enquanto elas estão se instruindo, adquirindo conhecimentos que certamente servirão de diferencial no momento certo (vou resistir à tentação de fazer um comentário que poderia facilmente ser classificado como machista e seguir em frente).

O que também chama a atenção é que religião e literatura podem ser boas companheiras quando caminham lado a lado. Dos títulos mais citados entre aqueles que são mais lidos, a Bíblia segue impávida em primeiro lugar. A seguir, vem A cabana, aquele engodo pretensioso escrito por William P. Young, e Ágape, do Padre Marcelo Rossi. Ou seja, brasileiro lê pouco e de maneira sistemática, buscando algum tipo de conforto espiritual numa atividade que primordialmente deveria servir ao lazer e ao engrandecimento intelectual. Mas tudo bem, é melhor ler um livro de religião do que não ler livro nenhum. É melhor até ler Paulo Coelho do que livro nenhum. De uma forma ou de outra, cultiva-se um hábito, mesmo que não se formem novos leitores (particularmente eu preferia que lessem Animais urbanos). Não acredito que os consumidores de tais, hum, autores se interessem por literatura a ponto de dali passarem a Veríssimo, Fernando Sabino, Guimarães Rosa etc. Embora Machado de Assis seja outro autor muito citado, creio que mais por imposição escolar do que exatamente por preferência popular.

Há muitos anos, o então ministro da Cultura Francisco Weffort declarou, em uma entrevista concedida à revista Veja, que Paulo Coelho prestava um grande bem á formação de novos leitores no país. Segundo ele, “a pessoa que pega um livro do Paulo Coelho para ler está deixando de assistir à televisão”, ou seja, está desenvolvendo um gosto por, vá lá, literatura. Concordo em parte. Não adianta ler só Paulo Coelho nem só livro de religião. Ler a Bíblia não faz de ninguém um leitor em potencial. Seria a mesma coisa que considerar como leitor assíduo uma pessoa que precisa ler manuais técnicos para aprender a operar equipamentos. E se de cada quatro livros dois ficam pelo caminho, não se pode dizer que a tarefa está sendo cumprida de forma satisfatória.

terça-feira, 3 de abril de 2012

Os espiões também amam


Certa vez Hitchcock disse que se filmasse uma versão de Cinderela, o público esperaria que houvesse um cadáver dentro da carruagem. Em outras palavras, quando um diretor consagrado por um gênero se arrisca em algo diferente, espera-se sempre que ele repita seu estilo e reproduza sua gramática narrativa de modo a caber naquele gênero. O diretor McG, especialista em fitas de ação, quis fazer uma coisa diferente e o resultado é este Guerra é guerra, cujo resultado é satisfatório, embora muito estranho para quem está acostumado com o rigor adocicado das comédias românticas.


Ele quis inovar e fez praticamente uma comédia romântica com muita aventura e adrenalina, na tentativa de seduzir o público masculino, normalmente avesso a esse tipo de fita. Pode funcionar, embora haja alguns equívocos na concepção do projeto. O principal deles foi escalar Reese Witherspoon como interesse amoroso disputado por dois homens. Não que ela seja feia, até está longe disso (tem charme e beleza suficientes para integrar a minha relação das 500 atrizes mais bonitas de todos os tempos), mas o papel pediria alguém com mais sex-appeal, mais atributos físicos, tipo uma Megan Fox, que seria a escolha mais adequada. Reese é certinha demais, pequena e frágil, não funciona direito, mas dá conta do recado, se admitirmos que é tudo uma fantasia escapista sem qualquer compromisso com verossimilhança.

Ela é uma executiva que passa a ser disputada por dois grandes amigos, Tuck (Tom Hardy) e FDR (Chris Pine), espiões da CIA, atividade que naturalmente facilita a busca por informações a respeito da loura, de seus hábitos de vida, gostos culturais, o que vai sendo usado pelos dois durante o cortejo, cada um tentando descobrir mais que o outro e atrapalhar o rival, mas sem muita violência nem questionamentos morais, é tudo um faz de conta para passar o tempo. Como ambos são espiões, entre uma cantada e outra, precisam trabalhar e resolver o caso de um terrorista que está escondido no país e planeja uma série de atentados, papel do alemão Till Schweiger. Mas essa subtrama é mal explicada e pior ainda desenvolvida, afinal, o foco ali é a disputa dos dois pelo coração da doce Lauren Scott (Reese). Depois de muitos tiros, explosões, correrias, sabotagens e algum romance, o roteiro arma o desfecho previsível, como convém a uma boa comédia romântica. Dizem que há um final alternativo, que modifica bastante o destino dos personagens, mas que foi descartado pelos produtores; esperamos que seja possível conhecê-lo ao assistirmos aos extras do DVD.

O grande mérito do filme é fazer com que homens e mulheres assistam juntos e numa boa a uma comédia romântica. A namorada vai se divertir com a comédia, o rapaz vai vibrar com as cenas de ação, sem preconceito, e no fim todo mundo sai feliz. A gente esquece tão logo vira a esquina. Mas, lá dentro da sala escura, é boa diversão.